domingo, 26 de fevereiro de 2023

Sonhos perdidos

            

 

 

          Era primavera quando  Rosalina recebeu  uma mensagem caliente de  alguém muito especial do seu passado. Uma mulher comum ao ler  uma mensagem como esta  provavelmente desceria do salto, chamaria o  remetente   de tarado, que só pensava naquilo. Chamaria as amigas maquiavélicas e arquitetariam um plano de vingança infalível que culminaria na impotência perpetua do pobre homem. Mas Rosalina   era diferente! Jamais faria algum mal a um homem que expressasse o seu desejo de  amor/eros  com fantasias inusitadas. Ela acreditava que o amor,  sem  criatividade e magia  embrutecia   a relação reduzindo-a  a simples exercícios físicos em dupla.  E  era primavera!

          Rosalina acreditava  que as estações do ano influenciavam diretamente o humor das pessoas. Além da  magia e beleza das flores, insetos e  dos sedutores canto de acasalamento dos pássaros a ciência já provou que a exposição  à luz do sol estimula a produção das três substâncias responsáveis pelo bom humor e  energia: serotonina, dopamina e  melatonina, e Rosalina vivia em um  país tropical e em  sua região na primavera a temperatura chega até 37º,  o que favorecia o desenrolar de grandes paixões,  a época  era propícia para se entregar de corpo e alma e realizar as fantasias  do parceiro para  juntos vivenciariam o fascínio do amor, a experiência  do absoluto que tudo transforma  fazendo da pessoa amada  uma quase  divindade. Um encontro como este exigiria um território neutro, e o universo conspiravam a seu favor, já que tinha que fazer uma viagem profissional  para a cidade  onde também se encontrava João Francisco, as datas do evento coincidiam  com o final da   lua crescente e início da cheia.. Na fase quarto crescente,  há uma aumento da libido das pessoas e os casais sentem uma vontade inexplicável de se amarem e se renovarem na intimidade. O poder mágico da   lua cheia favorece a compreensão dos desejos do outro e intensifica  as relações. Perfeito!

          O termômetro mais seguro para  o homem saber o quando é amado e desejado por uma  mulher é o tempo  que ela gasta se preparando somente para ele.  Rosalina desejava tanto João Francisco  que após ler a mensagem iniciou a maratona de cuidados com o corpo, começando pelos cabelos; hidratação, banho de creme exclusivo  para brilho intenso, escolha de uma nova cor, uma aparada básica para tirar as pontas abertas e ressecadas, depilação, sobrancelhas  e claro, não esquecia uma dia sequer dos cuidados diários:  limpar, tonificar, hidratar:  rosto, mãos e pés. Se  João Francisco sonhava com intensas noites de Bagdá, Rosalina não poderia decepcioná-lo, tinha que pensar em  cinco momentos diferentes que fugissem dos fetiches  relacionado ao imaginário popular e largamente difundido pela literatura e apresentado como desejáveis pela mídia:  cores vermelhas e pretas, cintas ligas, espartilhos entre  outros. Bem mais  do que uso variados de acessórios, a ocasião exigiria uma postura diferente concluiu Rosalina, já que João Francisco sonhava com  cinco noites de Bagdá, em sua imaginação ela  o viu como um  sultão e seu harém com mais de cem mulheres de diferentes culturas. Cada noite com uma.  Depois de muito pensar a ideia veio, claro que ela teria inúmeros obstáculos para ser realizada,  mas  daria o melhor de si, com intensidade, amor e carinho e no final do encontro,  sonhava que João Francisco  estivesse realizado plenamente, sentindo-se o homem mais amado e desejado de todos os tempos.

          A primeira noite  teria que  ser surpreendente, bem diferente da sua cultura e do passado dos dois. Rosalina inspirou-se na tradição das gueixas japonesas, e comprou um quimono de cetim, estampado com gueixas e flores de cerejeiras,  usaria  batom e sapatos  vermelhos, cabelo preso e finalizaria a produção com perfume do Brasil,  com notas de   breu branco para o toque amadeirado e de cumaru  para o toque adocicado. Em momentos  especiais a produção ajuda a estimular o sentido da visão, olfato e tato, porém, a ocasião exigiria mais: comportamento compatível com a fonte inspiradora. Assim, acontecesse o que acontecesse, Rosalina não desceria do salto, pois as gueixas são mulheres cultas,  delicadas e treinadas para  serem companhias agradáveis,  ouvir confidências, guardar segredos, entre outras tarefas que não incluem obrigatoriamente a prática sexual, cabendo a gueixa a opção de manter relações íntimas.  Nesta primeira noite de encontro, Rosalina  decidira que seria uma companhia adorável e se João Francisco a desejasse, se entregaria a ele com muito amor e carinho, uma noite sem reclamações, cobranças,  desentendimentos, ela tinha uma meta:  fazê-lo feliz!

           Depois de uma noite agradável, sem reservas à moda oriental, Rosalina pensou em surpreendê-lo como uma  mulher recatada  do século XIX quando o marido jamais podia ver o corpo da esposa e a ela não era permitido  demonstrar desejo e   prazer sexual, a penumbra e escuridão seria o clima ideal, sendo obrigada a satisfazer o desejo do parceiro se entregaria a ele com muita reserva e recato e com a tradicional obediências  que deviam aos parceiros. Eram  mulheres objetos, sem vontades,  educadas  para cumprirem deveres,   cuidar da casa e satisfazerem os desejos sexuais dos maridos sempre que o desejassem segundo a vontade deles, e principalmente, gerar filhos, e filhos homens de preferências. Difícil  comportamento,  mas por João Francisco, valeria a pena!

          E a terceira noite que surpresa prepararia para ele? Já esteve com uma mulher treinada para ser doce e agradável, uma mulher objeto que  apenas cumpre deveres impostos pela cultura.  Era hora de Rosalina se mostrar na sua essência mulher de sentimentos intensos que  se preocupava em dar e ter prazer, estimulando  os cincos sentidos, demoradamente, carinhosamente, sem  pressa pois a carícia  devolve a confiança, pele tocando pele com cuidado amoroso..... Rosalina abominava o sexo mecânico, comercial, exibicionista em que os parceiros se preocupam mais com as técnicas aprendidas  em revistas, filmes  e  vários orgasmos  no menor tempo possível. Na concepção dela, o ato sexual é sagrado, é o encontro das energias masculinas e femininas é o momento de acender a energia vital com longas e tranquilas preliminares despertando tanto para o prazer carnal como  para a consciência e juntos encontrarem o caminho do êxtase.

          A quarta noite  exigiria   uma mudança radical.  Assim Rosalina optou pela mulher dominadora e egoísta que trata o parceiro como um  objeto de seu prazer, estava ciente do risco que correria,  já que a personalidade de  João Francisco é de macho dominador, manipulador e egoísta que não enxerga as necessidades da  parceira  mas, se ele correspondesse as suas expectativas com certeza, no final da noite, seguindo a tradição das amazonas lhe daria o muiraquitã.

          Após uma noite de amor selvagem,  independente se resultado positivo ou negativo, Rosalina decidiu surpreender João  Francisco com uma última noite marcada pelas  tradições culturais dos povos nativos do Brasil o que exigiu uma árdua pesquisa dos costumes sexuais dos  índios. A primeira providência seria uma depilação à moda indígena, banho sem sabonete e claro, esperaria pelo amado  usando somente colores e brincos da étnicos Na cultura  indígena os papéis são bem definidos, homem faz o que é tarefa de homem e mulher  apenas as tarefas destinadas tradicionalmente as mulheres,  e não há  tabus sexuais, porém eles  não tem hábito de beijos na boca e carícias preliminares tradicionais da cultura européia.  Para Rosalina que aprecia longos e demorados beijos seria difícil  aparecer  nua na frente de João Francisco sem se jogar em seus braços e cobri-lo de  selinhos. Ela estava decidida,  manteria a postura  tribal de respeito  ao homem e cederia  docemente, aos avanços de João Francisco.

          Decisão tomada foi arrumar a mala, o que é um trabalho árduo quando se quer agradar um homem, já que incluía uma produção por noite,  fora a que ela teria que levar para  o dia  já que seus compromissos seriam desvinculados das noites de BAGDÁ.  Fora as produções, toda mulher apaixonada carrega o kit   de cuidados diários: Creme para a área dos olhos, rosto, pés, mãos, diurnos e noturnos, óleos  perfumados para massagem, perfumes,  desodorantes, sabonetes, xampus, condicionadores, e adereços para os cabelos. Com uma mala muito pesada,  Rosalina seguiu em uma longa viagem embalada pelo sonho de amar e ser amada, porém, ficou sozinha no hotel, João Francisco não apareceu uma noite sequer.

          Se  Rosalina fosse uma feminista  radical, diante de uma desfeita desta, por solidariedade feminina, convocaria uma reunião com as companheiras  de luta e traçariam um plano de ação para puni-lo severamente pelo desprezo.

          Se Rosalina fosse uma mulher romântica, choraria lágrimas de sangue, telefonaria para todas as amigas e familiares, pediria colo, juraria mil vezes nunca mais amar um homem e claro, terminaria no divã do analista.

          Se Rosalina  fosse uma mulher frágil e insegura, lamentaria muito,  se culparia pelo que aconteceu, se sentiria a última das mulheres, tentaria suicídio ou terminaria seus dias com  tarja preta.

          Se Rosalina fosse uma mulher vingativa, convocaria  as amigas  malvadas, revoltadas e mal amadas  para lhe ajudar na sua vingança que tornaria a vida de  João Francisco e  seus familiares em um inferno.

          Se Rosalina fosse uma mulher de  autoestima bem baixa, ingenuamente se entregaria aos amigos e conhecidos de João  Francisco, como a lhe dizer que ele não a quis, mas outros a quiseram e assim lentamente  secaria seu coração e sua dignidade.

          Se Rosalina fosse uma naturalista,  mudaria radicalmente sua dieta, selecionando apenas alimentos que melhoram o humor.

          Se Rosalina fosse apenas uma mulher moderna,  para esquecer o episódio humilhante  dedicaria de maneira extrema ao trabalho.

          Se Rosalina fosse filhinha mimada do papai, mamãe e irmãos, com certeza, o destino de João Francisco seria  trágico.

          Se Rosalina fosse uma mulher com cabeça do século XIX, com certeza se tornaria uma compradora compulsiva, comedora compulsiva, chocólotra ou coisas parecidas e até piores.

          Se  Rosalina fosse uma mulher fraca espiritualmente enveredaria pelo caminho do fanatismo religioso.

          Rosalina se preparou com  esmero e  carinho para o encontro, se sentiu  uma mendiga de afeto, carinho, colo, atenção, mas não seguiria  por estas trilhas porque era uma  mulher diferente!

           Após ser  desprezada de maneira tão humilhante que caminho Rosalina irá  seguir?                                                               

         

 

domingo, 19 de fevereiro de 2023

Rir para não chorar

 

Nonagenária   em quarentena

 

             O vento do sul soprou  forte no  final do inverno de 2021. A frente fria  subiu a serra do mar, chegou à terra da garoa e com ela uma chuva mansa e contínua  que favorecia a  introspecção. – “Não basta   refletir, é preciso registrar os últimos acontecimentos para a posteridade, ” - suspirou a anciã solitária, enquanto  a mão  trêmula segurava a caneta que deixava  marcas azuis na alvura do papel.

As janelas foram fechadas  às pressas  e em pouco minutos  gotas de água tamborilavam nas vidraças. Rosalina  observava as formas abstratas nas vidraças e  não podia deixar de se preocupar com a falta de ventilação no interior da residência  porque propicia a proliferação de ácaros, fungos, mofos, estes velhos  intrusos já tão conhecidos dos brasileiros  que  não pedem  licença  para entrar e exigem  muito trabalho e determinação para serem exterminados;  para completar o clube dos intrusos, em meados do verão de 2020, desembarcou em terras brasileiras, com  visto de permanência definitivo, o coronavírus. O peso dos anos exauriram as suas forças e a  diarista fora dispensada logo no início da pandemia. Já ia para mais de um ano sem uma  faxina rigorosa, e agora,  com a combinação de frio, umidade e sem circulação do ar, correria o risco de contrair uma doença respiratória e covid-19,  pois a vacina não garante 100% de proteção. Não sabia ao certo como estava sua saúde porque seguiu a risca as orientações do governo e dos profissionais de saúde durante a quarentena: “fique em casa” e mesmo se estivesse liberada para sair, de nada adiantaria, os Postos de Saúde podem ser focos de disseminação de doenças. Acreditava ser  mais seguro permanecer  reclusa,  utilizando o serviço de delivery, a arriscar-se nas ruas  cruzando com pessoas irresponsáveis, que não tem amor a vida  e  não fazem uso da barreira de proteção física – a máscara- ao  transitar pela cidade. Uma mudança repentina de hábitos pode ocasionar problemas de saúde  inesperados, principalmente em pessoas como ela, que  tinha vida ativa antes da pandemia. Apesar da idade avançada, fazia hidroginástica duas vezes por semana,  frequentava bailes  vespertinos aos sábados, trabalhava como voluntária na Pastoral da Criança aos domingos e ainda tinha tempo e disposição para um café com as amigas,  fazer compras em liquidações e as tarefas obrigatórias como supermercado e feiras livres. À noite, ouvidos atento à novela enquanto as mãos ágeis  tricotavam  bonitas peças destinadas a presentear as crianças do Orfanato Mãe Amorosa. Era uma rotina  pesada,  despertava com os passarinhos e  recolhia  aos seus aposentos após a última novela da TV aberta e antes de entregar-se aos braços de morfeu, lia  duas páginas da Bíblica Sagrada. De repente tudo mudou. Ela se viu confinada em um apartamento  com vista para o muro de uma fábrica abandonada,  e  as palavras de ordem do governador a martelar em sua cabeça: “  fique em casa, use máscara,  lave as mãos,  use álcool em gel.”  O que ela podia fazer para aliviar a tensão diante de tantas incertezas? Agarrar-se às agulhas, tricotar e tricotar; levantava do sofá somente para  os cuidados com  a alimentação. Lá pelo 233º dia de quarentena, as agulhas já  eram as suas melhores amigas e  queixava-se do calor  intenso que sentia nas pernas, do formigamento que subia da perna a virilha, inchaço e manchas vermelhas na pele. Obviamente  o par de agulhas  trabalhava indiferente aos queixumes da dona  e ela concluiu que era necessário procurar um especialista.  Optou por  consultar um  angiologista  em uma clínica popular próximo a sua residência, o que evitaria ter que usar transporte público, onde o  risco de contaminação comunitária era grande em decorrência da aglomeração de pessoas oriundas de diversas partes da cidade, da falta de ventilação no  interior do veículo e, principalmente, da possibilidade de alguém   tossir  ou espirrar e o coronavírus furar o bloqueio e ir acomodar-se  justamente em suas narinas ou garganta, - sempre há o risco, pequeno, mas é uma possibilidade, refletia.

            Para a consulta médica, Rosalina preparou-se como um soldado quando ia para a trincheira, nos idos tempos em que a espada e braços fortes determinavam o vencedor de uma batalha, nenhum detalhe foi esquecido. Optou por usar um vestido de mangas longas  para a proteção de seus braços,  um sapato confortável, duas máscaras  no rosto e mais duas de reserva  e o álcool gel na bolsa. Deixou tudo preparado para a sua volta,  sandálias na entrada, a porta do banheiro aberta,  para que não fosse necessário tocar a maçaneta ao adentrar para lavar as mãos e tomar banho. Temerosa, porém resoluta, enfrentou seus medos e  seguiu para a clínica; ficou satisfeita com a limpeza e organização. Não demorou nem dez minutos e foi chamada pela   jovem médica, que parecia  ter medo da paciente,   a olhou dos pés a cabeça e  prontamente   diagnosticou–a: era  luxação e  que ela precisava repousar. Com mais de nove décadas de vida,  a paciente  percebeu que a profissional não tinha  interesse em atendê-la, queria apenas o dinheiro da consulta e livrar-se dela o mais rápido possível.  Nesta circunstância, ser educada é difícil, mas a  anciã não se deu por vencida,  sentou-se confortavelmente na cadeira, passou álcool gel nas  mãos e pulsos, olhou firmemente  nos olhos da doutora e disse bem séria: Se eu tivesse alguma suspeita de  luxação, eu procuraria um ortopedista. Se a procurei é porque acredito que uma profissional com a sua especialidade possa   investigar, diagnosticar  e prescrever o tratamento adequado. Sem graça, a jovem seguiu o protocolo convencional de atendimento e completou: - para  que a  senhora fique tranquila, pedirei o exame, que é feito  aqui.  Em menos de uma hora, estava a nonagenária  de volta ao consultório e  finalmente, diagnosticada corretamente.  Princípio de trombose, nada muito grave, medicação correta e exercícios físicos acompanhados por especialista, seria o ideal, mas na impossibilidade de arcar com os custos,  uma caminhada diária será o suficiente  concluiu a doutora. Um pouco desconfiada, mas com medo de contrair a Covid-19, frequentando vários consultórios médicos, passou  em uma farmácia, comprou os medicamentos e retornou ao lar caminhando.

            Tanto tempo enclausurada,  ao ser  vista pelas vizinhas, não foi tão fácil assim, chegar em casa, todas queriam saber o que havia acontecido, tinha que ser grave, para ter-se arriscado em  uma consulta e quando desvencilhava de uma, já tinha duas acenando e a última, foi Helena,  que também conhecia a dor da perda do esposo e do único filho e as dificuldades de viver sozinha    com  idade avançada e  com todas as mazelas  características da  ironicamente chamada de    “ Melhor Idade”, que com certeza é uma invenção de algum jovem que desconhece  o sofrimento que é conviver com a perda diária de vitalidade, já não se sente com intensidade os aromas e sabores, audição e visão cada dia mais fracas  e as mãos já não conseguem perceber todas as texturas e ainda ter que suportar as dores ocasionadas pelo desgaste natural do corpo somados a isso, o peso das lembranças de magoas e arrependimentos do passado. Conversa vai, conversa vem, Helena chegou a sábia conclusão, que ambas eram um “peso morto” para a terra  porque estavam somente usufruindo de seus frutos sem dar nada  em troca, sem ter um descendente para  continuar  as tradições, lavrar a terra  e ainda  onerando os cofres públicos, com a aposentadoria, saúde, transporte e lazer. A lei natural é nascer, crescer, reproduzir, cuidar da prole, transmitir os conhecimentos adquiridos dos ancestrais e partir  para  “a cidade dos pés juntos”. Morrer é preciso, finalizou a amiga. Rosalina não queria despedir-se  do mundo e não tinha  pressa para ir ao encontro de seus bisavós, avós, pais, tios, primos, sobrinhos, marido, filho e amigos de infância, escola e trabalho. Estava só, reconhecia, mas ciente que um dia irá repousar eternamente em cova escura, adiar  este momento é o mais prudente, assim acreditava. Por volta das 18 horas, finalmente conseguiu chegar,  porém, não pode se jogar no sofá para descansar, havia um protocolo a seguir: Deixou os sapatos na entrada, lavou as mãos,  desinfetou  as maçanetas, bolsa, caixas de remédio e jogou no lixo a  nota fiscal e  sacolinha  plástica. Tudo limpo era a vez dos cuidados corporais,  tomou banho, lavou bem  os cabelos; a roupa que usara e  também as tolhas de rosto e banho  foram direto para a lavadora e não economizou no sabão em pó e menos ainda no desinfetante.

            Após a profilaxia de chegada da rua, enfim, pode  retomar o seu tricô e mal iniciou o diálogo com as agulhas, suas  inseparáveis parceiras   de trabalho, sentiu um incômodo  na garganta  e na sequência, a primeira tosse seca, além de incontáveis espirros. Em outros tempos,  isto não a teria preocupado, culparia o ar condicionado  da clínica e a friagem  característica do entardecer  de inverno; um chá de alho bem quente resolveria o problema. - Estou  com Covid-19, gritou desesperada! O que fazer? Não há remédios  com eficácia cientificamente comprovada, tentar  a medicina popular poderá camuflar sintomas mais graves. Só tenho como alternativa, melhorar a imunidade à moda antiga pensou.  Foi dormir pensando em uma estratégia para evitar uma entubação, pouco provável, mas possível, mesmo tendo tomado as duas doses da vacina. Acordou exausta, tossindo e com febre. Desesperada, pegou o telefone e fez o pedido de remédio para vermes intestinais e   multivitamínico sênior. Precisava também, enriquecer a alimentação, assim, açougue, varejão, padaria, supermercados e casa de produtos naturais receberam  pedidos, mas  a quantidade de entregas chamou a atenção do porteiro,  que comunicou o  fato ao síndico, um jovem eficiente e prestativo.  A pobre anciã levou mais de três horas para higienizar  e guardar todas as compras e ao término da tarefa, já lhe doía todo o corpo e ela achou prudente tomar um banho quente e repousar, só que acabou cochilando. Lá pelas dezenove horas, a campainha tocou. Rosalina  acordou assustada, esqueceu que já estava de pijama e atendeu a porta. Era o síndico e sua solícita esposa. Ambos concluíram que ela não estava bem e decidiram levá-la  a UPA. A tosse,  os espirros e a dificuldade de movimentar-se, em decorrência do excesso de  trabalho, contradizia o que ela tentava explicar, que não tinha nada, acreditava ser apenas um  forte resfriado. Ao  passar pela triagem, a enfermeira concluiu que era sintoma de  Covid-19 e a encaminhou para o atendimento especializado. Sem esperar o resultado do exame, o médico diagnosticou com firmeza: é Covid. A pobre senhora retornou ao lar com  o kit-covid e a firme promessa de que  um funcionário do prédio iria pontualmente  levar-lhe a medicação, que ela deveria ficar em isolamento durante quinze dias  e qualquer coisa que precisasse, era só interfonar na portaria, que ele, síndico ou a esposa, iriam atendê-la o mais rápido possível, para que nada mal lhe acontecesse. Que ficasse tranquila, eles cuidariam dela, concluiu o síndico e a desesperada senhora,  não teve outra alternativa, a não ser agradecer tamanha generosidade e resignada, a pobre senhora se viu obrigada a  aceitar que estava com covid-19, apesar de sua longa experiência de vida dizer-lhe que era apenas um forte resfriado.

            Foram dias difíceis! A pontualidade britânica do funcionário  não lhe permitia sequer tricotar, - a senhora precisa repousar, dizia com firmeza  enquanto a acomodava em sua cama. Assim, Rosalina, a única descendente viva de Pedro Raizeiro, o melhor curandeiro da  região, foi submetida a um  rigoroso tratamento desnecessário, exposta  a curiosidade  pública, todos os conhecidos, pelo WhatsApp, indagavam sobre os sintomas e nunca ofereciam ajuda, visitas estavam proibidas, mas um regalo, para quebrar a monotonia até que iria bem, pensava a anciã, que se sentia como uma criança, a mercê das decisões dos adultos. Mas tudo passa e findo os quinze dias  de isolamento social, ela foi  aparentemente esquecida e não ficou triste, precisava retomar o seu tricô, e principalmente a sua cozinha, já estava cansada  do tempero da  comida da esposa do síndico.

            Aos poucos a vida voltava ao normal e com a flexibilização decretada pelo governador, Rosalina, que já estava incomodada com a sujeira do apartamento, decidiu entrar em contato com  a faxineira para que esta retornasse ao trabalho, acertaria uma vez ao mês, ambas com máscara e  assim estariam protegidas. Contatar a profissional não foi fácil, o número  do telefone já pertencia  a outra pessoa  e  ela foi obrigada  revirar gavetas em busca de agendas antigas, após horas de  busca incansável, encontrou o telefone  de uma vizinha, que a informou que a sua prestadora  de serviço havia  sido uma das centenas de milhares de  vítimas da Covid-19, fazia aproximadamente uns seis meses, toda a família fora contaminada mas somente ela chegou a óbito. Perplexa, deixou cair o telefone e recostou-se no sofá. Não podia acreditar! A senhora Penha, era uma mulher jovem, apenas 40 anos de idade, forte, trabalhadora. Se havia partido há seis meses, por que os familiares não a comunicaram? Rosalina precisou de um tempo para  ordenar as ideias e os sentimentos. Após  uma xícara de chá de  melissa e valeriana, com o coração mais tranquilo, recordou a última conversa que tivera com a falecida,  uns dias antes do início do  primeiro lockdown na cidade, quando a dispensou temporariamente, e para garantir a prioridade no dia da semana em que limpava o  apartamento, quando a vida voltasse ao normal, 30% do valor  da diária seria  depositado mensalmente na conta  corrente de seu esposo,  no quinto dia útil do mês, porém, na realidade, a verdade era outra, Rosalina previa as dificuldades que a profissional autônoma enfrentaria durante o período da quarentena, mas não queria  humilhá-la  com doações em dinheiro, em consideração aos anos de bons serviços prestados e  fez uso de  um argumento convincente para que ela aceitasse o trato –“Então, a verdade é uma só, o viúvo não  comunicou o falecimento para que eu continuasse  a efetuar o pagamento,  concluiu com tristeza.”

             A cada nova aurora, Rosalina parecia estar mais incomodada com  o pó acumulado e sem coragem para contratar outra profissional de limpeza,  com medo de  ser contaminada com a  variante “Delta”decidiu fazer o serviço. Tinha ciência que  levaria  no mínimo três dias, faltava-lhe o vigor dos quarenta anos e o  melhor seria começar pelos mais difíceis e  num piscar de olhos, elaborou a escala de serviço. Primeiro dia, cozinha e área de serviço, segundo dia, banheiro  e terceiro dia, quartos e sala, porém,  a empolgação não lhe permitiu recordar a forte alergia a ácaro. Enfrentou o trabalho pesado com a mesma alegria que uma criança desfruta    de um brinquedo novo. O cansaço  e as dores no corpo não  minaram o seu entusiasmo durante os dois primeiros dias, porém,  quando começou a limpar  guarda-roupa e estante,   percebeu que precisava  tomar um antialérgico,  mas eles estavam vencidos, ir até a farmácia atrasaria o serviço, pedir por delivery  era uma boa opção, porém, poderia  chamar a atenção do porteiro e correria o risco de  ser levada a UPA sem necessidade, assim, não viu outra alternativa a não ser continuar a tarefa, apesar do mal estar, mas esta, não foi uma boa opção!

            Rosalina acordou  com os olhos lacrimejantes,  dor na  garganta, tosse e falta de ar,  um pouco de febre,  dores generalizadas pelo corpo, em virtude do excesso de trabalho dos dias anteriores, mas isto não a preocupou, sabia que precisa  apenas da medicação rotineira e repouso. Tomou café da manhã e decidiu ir à farmácia, na volta passaria pelo varejão, compraria algumas frutas para que não levantasse suspeita de que não estava bem.  Assim pensou, assim o fez, porém, ao passar pela portaria, tropeçou, caiu e bateu com a cabeça no degrau  da escada, nada grave, não chegou a sangrar, mas ficou um pouco tonta e com confusão mental; o síndico foi chamado e a levou ao hospital mais próximo. Ao vê-la gemendo de dor, com dificuldade para respirar e tossindo muito e  tosse  seca,   o enfermeiro da sala de triagem,  encaminhou-a para a ala de Covid-19. Ela tentou explicar o ocorrido, mas não foi levada a sério pelos médicos, talvez  pela idade avançada,  eles  devem ter concluído que  paciente  estava  com alzheimer. Internaram-na em um quarto coletivo e mais uma vez a pobre senhora foi submetida ao tratamento para Covid-19. Implorou que lhe dessem um antialérgico, mas o pedido não foi atendido. Foram cinco dias de martírio e finalmente saiu  o resultado do teste, “negativo”, e ela recebeu alta. O retorno ao lar foi tranquilo. Saciada a curiosidade da vizinhança, ela pensou que enfim, retomaria a sua rotina, mas não foi bem assim.

 Rosalina acordou cansada, sentia que o ar lhe faltava,    a tosse seca a incomodava e tinha um pouco de febre. Reuniu forças e foi preparar o café da manhã e então percebeu que não sentia o cheiro e nem os sabores dos alimentos, desta vez sim, ela  havia contraído Covid-19, durante o período de internação.  Revoltada com as experiências anteriores,  decidiu não procurar ajuda médica, deixaria a natureza completar o ciclo nascimento/morte, já tinha sido abençoada por Deus com noventa anos de vida e bem vividos. Quando o seu corpo, em estado avançado decomposição, incomodasse os vizinhos, eles que tomassem  providências, porém, não morreria sem lutar. Lutaria à moda antiga:  água, comida, repouso e práticas medicinais  tradicionais. Não tinha descendentes,   a partilha de seus bens já estava em testamento, mas a experiência traumática com o coronavírus  e diagnósticos precipitados precisavam ser registrados  para a posteridade. Ela sentia  que tinha pouco tempo e suplicava ao Criador que  lhe permitisse a glória de colocar o ponto final em seu relato.  Gotas de chuva tamborilavam na janela criando   enigmáticas formas abstratas   indiferentes às dores  humanas

 

           

           

Ser mediador

          

As relações  humanas são permeadas por conflitos, e na maioria das vezes, resolvidos de forma natural e pacífica, mas quando  a divergência é tida como impossível de ser resolvida entre os envolvidos, faz-se necessário a ajuda de uma terceira pessoa  neutra e capacitada para  restabelecer o diálogo entre as partes e  direcioná-los para que juntos, encontrem    uma solução para o conflito  e que a convivência respeitosa seja restabelecida nas relações continuadas como  família e vizinhos e nestas demandas, a mediação é uma boa opção.

            As partes chegam a sessão de mediação com uma carga emocional  intensa que  interfere em seus relatos, e  cabe ao mediador favorecer  a comunicação entre os mediandos  com  o uso de ferramentas específicas  capazes de romper o círculo vicioso de acusações mútuas  e  criar um espaço conversacional. Por meio do diálogo, o mediador vai avaliando a eficácia  das técnicas que começam a ser utilizadas  ao receber as partes para que elas sintam-se acolhidas  e confiantes no processo; o mediador deve estar atento  aos detalhes que facilitarão a comunicação, como fazer uso da 2ª pessoa, normalizar  o conflito, encorajá-los  para que se percebem  como responsáveis pelo conflito e protagonistas da solução.

            Cada técnica possui a sua especificidade. A técnica do resumo ajuda a organizar  e modificar o clima de  hostilidades, recapitular os fatos e planejar a próxima etapa. Parafrasear: ao fazer uso desta técnica, o mediador demonstra que está  ouvindo com atenção, oferece a oportunidade de ser  corrigido pelos  mediandos, além de possibilitar o ouvir pela boca do outro o  que favorece uma mudança de percepção. Faz-se necessário estar sempre  atento para não negligenciar a escuta  empática, o respeito ao  outro e a sua verdade. De sua importância também é a técnica de fazer perguntas, sem parecer invasivo convida os mediandos a aderir à conversa com naturalidade o que favorece reflexões que culminam em mudanças de visão sobre o conflito, e consequentemente, em acordos que satisfaça as partes.

            As técnicas são recursos importantes e úteis para fazer intervenções que favoreçam o diálogo para que a sessão culmine com um acordo que contemple ambas as partes. O profissional de mediação deve estar sempre em busca de  aprimoramento das técnicas para incorporá-las  no dia a dia do exercício da função Finalizando: a arte de  mediar exige  estudo e prática constante  para que alcance o estágio de  ser considerado “Inconsciente competente.”

Um olhar sobre o conflito

         

Evitar  conflitos é um pensamento recorrente nas relações familiares, sociais e profissionais, porém, é inevitável porque o conflito é   inerente ao ser humano e  faz parte da dinâmica da vida das relações humanas e em seu lado positivo, cria possibilidades para o crescimento salutar, porém, se não bem trabalhados, os conflitos  tornar-se-ão  ciclos de sofrimento  e destruição que perdurarão por tempo  indeterminado. Para que haja a ruptura do ciclo e iniciar  o processo de transformação, faz-se necessário manter um viés proativo  e vislumbrar o conflito como  potencial catalisador de crescimento  e concentrar-se nas facetas menos visíveis dos relacionamentos

Sobre o conflito, usando como metáfora o corpo humano, na cabeça encontra-se os conceitos e como abordá-los e a percepção para transformação. O coração é a pulsação  da vida e  simbolicamente, o ponto de partida e de chegada, o centro da transformação. As mãos constroem, tocam,  modificam, e fazem acontecer. Os pés  e as pernas representam o elo de ligação com o chão e como as mãos, representam a ação, capaz de  transformar   os desafios da vida real incluindo  uma maneira  de abordar o conflito  de modo a reduzir a violência e aumentar a justiça  nos relacionamentos sociais, e desenvolver no grupo, a capacidade e interação  mesmo diante das adversidades.

 A vida  sem conflitos seria uma rotina tediosa,  eles fazem parte do processo  evolutivo  do homem, porém, faz-se necessário a compreensão das causas  e condições sociais e culturais  em que eles estão inseridos, para depois promover o  diálogo e  possibilitar  aos  indivíduos a participação na resolução dos conflitos que os afligem, portanto, os objetivos  de mudanças de transformações em conflitos consistem em:   no âmbito pessoal, enfatizar o potencial de crescimento e bem estar do indivíduo. À nível relacional, minimizar a comunicação disfuncional  e expandir o entendimento.  Referente ao nível estrutural, compreender e tratar as causas que dão origem ao conflito. No quesito cultural, identificar e  construir  com recursos oriundos do contexto  cultural,  maneiras construtivas para lidar com o conflito visando   a paz e o bem estar de todos porque  sempre haverá conflitos em todos os seguimentos sociais, o diferencial está em COMO líder com eles.

sábado, 18 de fevereiro de 2023

Desentendimento no ateliê de costura

         

         As  duas palavras preferidas das mulheres  são “promoção e liquidação” e Rosalina não é diferente, não por opção, mas por necessidade, bem que gostaria de usufruir da qualidade da alta costura, mas enfim, nascer e permanecer na pobreza é sina de muitos infelizes, por mais que eles trabalhem; este mistério não é explicado nem pela  religião e menos ainda, pela ciência e avançar para a classe social acima da sua, é privilégio de poucos e a nossa personagem, amarga  o destino de viver na carestia, sempre tendo que optar, ou compra a blusa ou a saia, ou o tomate ou a alface, ou o sorvete ou a empada. Assim sempre foi e sempre será, desde os tempos  bíblicos. Pobre é pobre e ponto final!

        Em uma tarde quente de verão, em que perambulava pelas ruas paulistanas, entrou em um shopping com o intuito de usufruir  do ar condicionado, recuperar as forças e voltar para casa, caminhando, a condução está muito cara e táxi é para a  Angélica. Enquanto descansava as pernas, seus olhos percorriam as  vitrines e eis que deparam com  uma placa vistosa  que anunciava liquidação de camisas femininas, qualquer modelo por R$30,00. Estava com fome sim, porém, optou por pela compra e saiu satisfeita,  preço bom, porém, precisava cortar as mangas.

        Foi uma compra de impulso, abdicou do lanche, deixou o estômago padecendo por algumas horas,  e agora precisava de uma costureira. Consulta uma amiga, uma vizinha até que  conseguiu um ateliê  especializado em reparos e lá foi ela, levando uma blusa de modelo para o  acabamento modelo “francesinha” e a atendente já anunciou o preço, R$25,00, sendo 50% adiantado, prazo de cinco dias para retirar, ela não se opôs, e com o restante do dinheiro na bolsa, no dia marcado,  partiu para buscar a encomenda.

        Entregou a ordem de serviço, recebeu a sua sacola e pegou a blusa para  verificar o trabalho, para sua surpresa, a manga tinha  acabado simples. – Moça, não foi assim que pedi para fazer, trouxe uma blusa de modelo, e o trabalho foi executado de outra maneira,  disse à atendente que  prontamente respondeu. – A dona da loja não está, mas pode deixar que nós refaremos o serviço. Por ter noção de costura, Rosalina sabia que não seria possível e disse: - não dá para  reparar o erro, olha o pouco tecido para fazer a dobra, porém, a moça não se intimidou e  retrucou:  por que você está sendo ignorante comigo, eu não estou me negando a reparar o erro. E a cliente já irritada respondeu – não estou sendo ignorante, estou apenas dizendo que falta tecido para fazer a dobra necessária. A jovem não se deu por vencida e completou – tem as sobras ali. Enraivecida, frustrada a cliente  acrescentou- Sabe de uma coisa, vou resolver  do jeito mas simples, vou lhe pagar  e nunca mais voltarei aqui, entregou o dinheiro e quando ia saindo, a funcionária a insultou –Pode ir embora mesmo,  não precisamos de cliente como você.

        Rosalina  não conseguiu compreender porque o incidente a deixara tão abalada, talvez, pelo sofrimento de ter perdido o beneficio da promoção, abriu mão do alimento para  adquiri-lo, não ficou do seu agrado e ainda teve um custo de R$10,00 para levar a peça,R$10,00 para buscá-la  que somado aos R$25,00 do reparo,  mais o custo da blusa de R$ 30,00,  totalizando R$75,00, no qual ela poderia ter gasto em uma peça de  mais qualidade e sem dissabores. Pensando em direitos do consumidor, o certo seria que  funcionária se desculpasse pelo erro e não ofendesse a cliente  que não teve a ordem de serviço cumprida a contento. Maltratar cliente ofendido não é uma boa opção, da mesma maneira que ela chegou lá por indicação, outras  clientes em potencial não  irão levar serviço por recomendação, e com certeza, Rosalina irá contar à todas as mulheres de seu círculo de amizades a humilhação sofrida.

       

domingo, 12 de fevereiro de 2023

As mão de Rosalina

                   Quem não admira as mãos dos bebês, que seguram com firmeza o dedo do cuidador? Assim era as mão de Rosalina quando nasceu: pequenas, delicadas e brancas e sua avó não cansava de admira-las. - não têm uma manchinha sequer, dizia com  orgulho!  Em seu íntimo, a anciã já sabia que tanta beleza em mãos de uma criança não duraria muito porque a labuta da vida no campo é diária  e dura e o trabalho não cessa, sol a pino ou chuva torrencial, plantações e animais precisam de cuidados e as mãos são as principais ferramentas da lida diária. Há quem diga que a maior descoberta  da humanidade não foi o fogo, mas o uso das mãos!

          As  alvas mão de Rosalina começaram a trabalhar cedo! Sua mãe não produziu leite suficiente para alimenta-la e segurar a mamadeira foi o seu primeiro trabalho, antes mesmo que se juntassem em prece, pedindo  chuva a Santo Isidoro Lavrador. E à medida que crescia, as tarefas foram sendo acumuladas, como arranca ervas daninhas na horta,  semear feijão, aduba-lo, colhê-lo, e  tantas outras. No ritmo da natureza, os anos seguiam  as marcas do tempo foram ficando nas  mãos alvas de Rosalina.

        Graças a modernidade  impulsionada pelo governo de JK, mudanças ocorreram no país e na vida das pessoas e o pobre teve acesso, entre tantas outras coisas, aos cremes para as mãos e para todos os  poderes aquisitivo, então Rosalina pode enfim, cuidar de suas maltratadas mãos, com cremes baratos, disponíveis em supermercados, já aposentada,  recebendo apenas um salário mínimo e com a responsabilidade de todos os trabalhos domésticos, porque os filhos  abandonaram o ninho, agora  podia se dar a   este pequeno luxo.

        Rosalina, como a maioria da população brasileira associava o valor do produto a qualidade e  lamentava não poder comprar um creme caro, mas ganhou um, no bingo da igreja, e usava todas as noites, antes de dormir, no entanto, suas mãos começaram a soltar pele,  e ela pediu uma consulta com o dermatologista do  SUS, que levou quase um ano para conseguir e neste lapso de tempo, o creme acabou e ela   comprou o mais barato do mercado, e por  ter custado pouco, ela usava sempre que  executada uma tarefa doméstica e em três dias,  a pele de suas mãos estava   normal e em sua ingenuidade ela refletiu que  as indústria desenvolvem creme  barato para as mãos dos pobres. Suas mãos trazem as marcas do tempo e do trabalho duro no campo  e no lar, porém, ainda dotadas de força.

domingo, 5 de fevereiro de 2023

Irmãs Hospitaleiras

        

    Quanto mais  velha eu fico, mais sedimenta em mim, a certeza que a  que grande mídia presta um deserviço  à população carente, que enfatiza a violência, desonestidade e a carestia crônica do trabalhador brasileiro. Bem que ela poderia mostrar  iniciativas privadas ou  das igrejas que  dão certo há muito tempo, para que quando não assistido pelo poder público, que tem a obrigação, teria uma segunda opção para conseguir o acesso à saúde,  que é um direito garantido   apenas  em  nossa Carta Magna.

        Hoje conheci um dos mais lindos e piedosos trabalhos da Igreja Católica Apostólica Romana, a obra social das Irmãs Hospitaleiras,  cujo cerne é o amor e o cuidado aos mais vulneráveis e   esquecidos pelo poder público.  No século XIX,  as duas jovens, nascidas em Granada, Espanha, Maria Josefa Récio e Maria Angústias Gimenez, ouviram o chamado Divino para que dedicassem suas vidas à causa dos pobres e doentes,inclusive doentes mentais. Com a  orientação espiritual de Benito Menni, hoje São Bento Menni, e com o rigoroso lema: rogar, trabalhar, padecer, sofrer, amar a Deus e calar. Em 31 de maio de 1881 deram início à Congregação, e em 30 de outubro de 1883 faleceu Maria Josefa Récio, vítima da caridade hospitaleira. A sua parceira viveu ainda 14 anos, tendo falecido em 1897.

        Graças a determinação, fé em Deus e amor ao próximo, Em  25/10/1980, inaugurou-se o 3º Hospital da Congregação no Brasil. A Clínica São Bento Menni, em Divinópolis, MG. È um trabalho pouco divulgado e muitas famílias, em busca de tratamento para seu doente,  rumam à capital mineira, quando poderiam usufruir de um serviço mais próximo e de mais qualidade. Você que está  lendo este post, por favor, ajude a divulgar a obra maravilhosa das Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus.