segunda-feira, 29 de abril de 2019

Falácia de um trabalhador


          Eu não  enjeito  e nem tenho medo de serviço, seja domingo ou feriado santo, apareceu trabalho remunerado, eu compareço. Levanto cedo, tomo meu café na padaria e  lá vou eu para o batente, ao contrário de alguns  colegas que chegam aos postos de trabalhos, fumam um cigarro, olham as mensagens do whatsApp e depois de uma meia hora  iniciam as suas atividades. Durante a minha  jornada,  se preciso efetuar uma chamada para resolver alguma questão profissional pendente e por descuido, clico no contato de uma, das minhas namoradas, sem a menor cerimônia  peço desculpas pelo equívoco. Horário de trabalho é sagrado e não dou prejuízo ao contratante que  paga para eu trabalhar e não papear com as meninas.
          Dizem que eu sou “Caxias e puxa saco de patrão” não é nada disso, eu labuto pesado não por amor ao ofício, mas por amar perdidamente o dinheiro  resultado da  venda da minha força de trabalho e nem  quero saber dessa tal de “mais-valia” que os filiados aos sindicatos tanto falam. Em meu entendimento as coisas são mais simples: eu ponho o preço no serviço, o  patrão  paga e fecha-se o acordo  entre homens de palavra, e não  há quem duvide da máxima que diz: com dinheiro no bolso qualquer homem é bonito e atraente.
          Como sou um profissional bastante requisitado em virtude  do meu profissionalismo, quase não tenho  tempo para o ócio, mas  quando disponho de uma pequena folga, eu gasto mesmo; em sofisticadas padarias, finos restaurantes, luxuosos teatros  e até mesmo em lugares modestos em companhias alegres  bebendo e comemorando a  vida, e se gasto em um dia, o que levei um mês  para ganhar, não é da conta de ninguém, porque quem levanta parede, bate laje, descarrega  caminhão, sou eu, portanto não tenho que dar satisfação. Minha sina é trabalhar, divertir e pagar a conta!
           

domingo, 28 de abril de 2019

Destilando veneno


          Você  recomendou-me que eu procurasse  apoio na igreja, familiares, medicina alternativa e convencional como psiquiatria  para que eu pudesse aprender a lidar com a rejeição. Eu não quero aprender a lidar com a galharda, é mais um equívoco seu, inclusive, já mandei serrá-la, rente ao couro cabeludo e as raízes foram  extirpadas com o buticão de um bom veterinário.  Quem precisa se curar  do complexo de  segundo lugar, preterida é você  e não adianta aprofundamento espiritual e  crendices populares, nada disso lhe devolverá a sua autoestima porque  a sua cura depende da  minha medicação personalizada que você conhece de um passado longínquo, e era boa, pois sem querer,  implantei em você a paixão, o prazer de me amar e ser amada, por mim.
          A poção  mágica  capaz de libertá-la desse grilo psicótico, que você está a sentir com  relação à minha pessoa é exclusividade minha e deve ser ministrada  em doses homeopáticas até aliviar o seu ego machucado, a questão é: será que eu tenho tempo e disposição para cuidar do  faniquito que você diz que lhe causei  em nosso último jantar? Abra a sua comporta emocional e deságue  esses pensamentos equivocados  em outros rios porque  eu sei que após a nossa separação você se envolveu  em outros relacionamentos e agora acusa-me de ser o responsável pelas suas dores de amor. Eu não vou assumir uma carga que não é minha, procure outra transportadora e  doravante não mais lerei a sua correspondência.
          A partir de hoje, minhas manhãs serão dedicadas a leitura  de textos  enviados  por uma pessoa inteligente cujos trabalhos possuem frases concatenadas capazes de adequar as necessidades pessoais, intelectuais do leitor que por si mesmo, vai detendo em uma ou outra imagem que o faz viajar  mentalmente  para locais distantes que deixaram saudade ou  que desperta-lhe o interesse de conhecê-los.

sábado, 27 de abril de 2019

Carta à Afonsina



          Olho o relógio, são dezenove e fico a imaginar você, em frente ao espelho a embelezar-se para ir a uma quermesse  ou  a alguma reunião de filatelistas com o intuito de preencher o seu tempo, o vazio de sua vida sem a minha proteção e  riqueza cultural de  minha família, que você deseja secretamente uma vaga  na aba de meu chapéu e enfim, ter uma ascensão social casando-se comigo já que és  de família pobre e desprovida de saber científico, tanto  é verdade, que sempre que tem que redigir algum texto, envia-me o original pedindo que eu faça a correção porque você  é fruto de escola pública e não lhe foi  ensinado as regras gramaticais mínimas  da forma padrão da língua materna.
          Pessoas como você, que  não tem argumentos para discutir com um letrado como eu, quando se vê sem palavras apela para  a intercessão de Nossa Senhora Aparecida, padroeira do Brasil, de São Paulo, padroeiro do estado  e Nossa Senhora da Conceição, padroeira da cidade, como se essas entidades, frutos da criação humana tivessem o poder de colocar em sua boa as palavras corretas para vencer uma discussão. E quer saber mais? Não quero a sua companhia nem mesmo para um encontro casual. Eu não compactuo com tradições populares de  rezas, benzedeiras e garrafadas; sou cético, um  homem das ciências exatas, o que eu não impediu-me de ampliar meus conhecimentos em  outras áreas do saber graças as minhas inúmeras viagens pelo mundo, estudos científicos  e convívio com gente de elevadíssimo nível cultural; eu  consigo dialogar sobre qualquer assunto, com qualquer pessoa e você não consegui ir além das noticias vistas nos telejornais, novelas, receitas e  dos  altos preços das verduras nas feiras livres, tanto que fique apreensivo quando soube que frequenta  clube filatélico e fico a imaginar  a pobreza dos diálogos entre os membros  do grupo. Será que eles conseguem discorrer sobre a história da filatelia brasileira?  Já pesquisaram sobre Olho-de-boi? Eu tenho uma coleção de selo valiosíssima  e, se nunca lhe mostrei é porque sei que o seu nível intelectual  não lhe permite compreender  o seu valor cultural e  de mercado. Para ser um filatelista é preciso ter discernimento, disposição para pesquisa e contato com outros apaixonados por este tipo de colecionismo. Vou encerrar porque  tenho   muito trabalho a fazer  porque à noite irei jantar com os meus familiares em um elegante shopping, estes são os lugares que eu frequento. Adeus!  Afrânio



sexta-feira, 26 de abril de 2019

Fragilidade do tirano


          Giovanni,  filho de uma  possessiva mama italiana e herdeiro de uma fortuna considerada, graças as injustiças cometidas  pelos seus antepassados  casou-se cedo com uma prima de posses iguais, tiveram  quatro filhos e logo se divorciaram  alegando incompatibilidade de gênios porque  assim os advogados decidiram  já que não ficaria bem constar nos autos do processo que a razão da separação do casal era a tirania  do marido que  tratava a esposa como uma de suas propriedades e  anulava-a como ser humano e graças a intervenção  de seus familiares, ela conseguiu se libertar da masmorra em que vivia desde o primeiro dia de seu casamento, quando o sonho de princesa transformou-se em escravidão.  A guarda dos filhos ficou sob responsabilidade materna e  ele retornou à barra da saia da mamãe e saiu em busca de sua próxima vítima, com anúncios em jornais, participação em programas de televisão, cruzeiros para solteiros e por muitos anos destruiu sonhos e corações até que uma dia a flecha do cupido acertou o seu coração e ele se viu perdidamente apaixonado, mais do que isso, dependente emocional de uma mulher que apreciava a companhia de  vários homens. Humilhado e abandonado por ela,  o  destruidor de ilusões e corações chorou como um bebê faminto.
          No dia em que o castelo de autoritarismo que ele acreditava ter sido construído com ferragem e cimento, portanto, sólido, desabou como um dia areia        na praia, pranteou por dias a fio, procurou o auxílio de  psicólogos, neurologistas, psiquiatras  em busca de uma razão para os acontecimentos que traduzidos em uma linguagem popular nada mais é do que o poderoso carvalho ter se curvado para  as plantas rasteiras  e sem  conseguir minar as labaredas que o consumia, buscou  amparo na fé, peregrinando por várias igrejas e chegou até frequentar outras linhas de pensamentos religiosos e   lá também,  o orgulho ferido não encontrou alento. Assim, o grande homem de negócios se viu frágil como uma  folha ao sabor dos ventos.
          Ela não aceitava o fato de  ele, um homem rico, estudado e nascido em família de quatrocentões  paulistas ter sido trocado por homens humildes como um vaqueiro e um caixa de supermercado. Para abrandar a humilhação ele agarrava com força à mão dos familiares, fato decisivo para  que ele  não atentasse contra a própria vida. Durante os meses de lamúrias, em que ele acreditava estar rastejando na lama, conheceu pessoas meigas e ingênuas que acreditaram que a sua dor era oriunda de um amor destruído, ofereceram seu carinho sem  imaginar que tão logo a ferida do orgulho  cicatrizasse,  o tirano renasceria das cinza e novos corações femininos seriam destruídos.

quinta-feira, 25 de abril de 2019

Professor eventual


                    Um dos ambientes mais complexos  de trabalho é  o escolar, principalmente na educação infantil  e ensino fundamental, onde a falta de um funcionário causa transtornos e se for do mestre,  até acidentes graves porque crianças são  curiosas, inquietas e  inconsequentes e precisam estar sempre sob olhares vigilantes, razão pela qual   Estados e Prefeituras costumam trabalhar com  professor eventual ou substituo, popularmente conhecido como  “tapa buraco”, não importa a nomenclatura, mas a dura sina do profissional  arrimo de família e desempregado que perambula de um lado  e outro em busca de uma vaga que lhe possa, no final do mês render alguns trocados.
          A maratona   em busca de uma vaga na rede de ensino pública começa com a vigília na internet  em busca do edital, o pagamento da inscrição,  estudo do conteúdo indicado, prova  e o retorno à internet em busca da  lista de classificação. Após a felicidade  de saber que foi classificada, inicia-se uma nova  jornada em busca de uma vaga: preparação dos documentos exigidos para a contratação, horas online para não perder as datas e no preparo de uma aula curinga  idas e vindas em Diretorias de Ensino, escola e finalmente,  a angustiante espera de ouvir o  toque do telefone  e uma diretora  solicitando sua presença para  substituir o professor que faltou e assim  vai-se  o ano, cobrindo licença maternidade, doença, faltas  justificadas, gala, luto e agradecendo a Deus porque pingar é melhor do que faltar e sempre com o coração e a carteira apertados porque se não vagar ele nada recebe, mas a fome é diária e não espera.
          Esta é a sina de milhares de professores pelo Brasil afora, que abdicaram de lazer, de sono  do convívio familiar e alguns, enfrentaram horas de trânsito para  conseguir estudar e na hora esperada de ingressarem no mercado de trabalho, têm que enfrentar  vários obstáculos  para enfim, adentrar em uma sala de aula e o pior ainda estava por vir porque  não serão respeitados nem como  profissionais, seres humanos e quiçá  pelo seu saber arduamente conquistado.

quarta-feira, 24 de abril de 2019

Violência urbana



          Distante está o tempo em que bairros populares as pessoas sentavam à porta de suas casas para  “tomar a fresca” e atualizarem-se dos acontecimentos diários. Inúmeras pessoas responsabilizam o WhatsApp pela perda deste costume saudável, porém, o aplicativo não pode arcar sozinho com  o peso  da culpa. O que encarcerou  as famílias em seus lares foi a violência e verdade seja dita, nem mesmo atrás das grades estão seguros porque  os jovens ladrões adentram em suas casas, amarram e torturam os moradores, zombam de seus sofrimentos e ainda levam seus pertences, fruto de  trabalho  duro e privações porque a realidade do trabalhador brasileiro é: para conseguir uma coisa tem que abrir mão de outra, exemplificando: se uma família deseja viajar, ela terá que reduzir as compras do mercado,das lojas, lazer etc.
          Tentar fugir da  violência dos grandes centros urbanos e transferir a base residencial para  cidades de pequeno e médio porte é perda de tempo  e dinheiro, porque estas também estão violentas  e os jovens assaltantes já não se preocupam em esconder o rosto. Adolescentes, mulheres e idosos são  os alvos preferidos e o sexo feminino, as que mais sofrem, porque não satisfeitos em pegar a bolsa,  são revistas pelos meliantes em busca de  pochetes, notas escondidas nas meias, nos seios, ou seja, são violentadas em sua  intimidade.
          Em bairros residências andam assustadas, apressadas e procuram sair  somente no intervalo de nove  às dezoito horas, horário em que os moradores estão acordados para o caso de precisar pedir socorro. Aquelas que conseguiram o seu automóvel não estão seguras, antes de manobrar para entrar na garagem, dão voltas no quarteirão com medo de algum suspeito estar à espreita e, apesar deste cuidado, não raro são surpreendidas  por jovens que aproveitam  o carro  da vítima para levar também os eletrodomésticos de valor. Idosos estão sendo obrigados a aprender novas tecnologias para efetuar  pagamentos e transferências online porque   entrar em uma agência bancária para sacar dinheiro é tão perigo quanto atravessar um campo minado. Triste  é o destino das  pessoas de bem: assustadas, acuadas,  prisioneiras que sequem podem desfrutar do   direito de ir e vir, apreciar as estrelas do céu e do seu dinheiro ganhado com muito esforço.

         
         

terça-feira, 23 de abril de 2019

Agricultor, abençoado seja



          Agricultor, uma profissão que nasceu em tempos longínquos, por mãos femininas,  na época em que os homens ainda habitavam as cavernas. É um trabalho difícil porque depende de fatores externos como as condições climáticas, tipos de solos, pragas silvestre e escoamento de sua safra. Graças a labuta diária deste profissional, que o alimento chega à mesa da população e o seu ofício é um gesto de amor diário no cuidado com a plantação. Além do sustento diário,  depende-se dele também para o lazer, já que a matéria -  prima para a produção de bebidas também é fruto do seu labor.
          A produção da tequila, patrimônio cultural do México, desde 1974, é uma bebida  destilada cuja matéria - prima é a planta denominada agave azul. Abençoadas sejam as mãos dos agricultores que a cultivam!
          Acredita-se que a popularíssima cerveja foi a primeira bebida  a ser fabricada pelo homem  no período Neolítico e sua matéria - prima, a cevada, também passa pela mãos do agricultor, assim  como o lúpulo, planta responsável pelo sabor amargo e característico da bebida.
          E quem cuida das belas parreiras para que produzam uvas  de qualidade  para produção de vinho com aromas e sabores divinos? O agricultor! Ele não teme as geadas as  temperaturas altas,  por amor à sua plantação, desenvolve tecnologias para protegê-las das intempéries  climáticas.
          Sob olhares vigilantes e amorosos, crescem tubérculos, como a batata para a produção de vodka com  sabor mais acentuado.
          Dos imensos arrozais japoneses, cuidados por agricultores artistas, saem a matéria-prima para produção do saquê de diversos sabores e nuances, ele pode  ter corpo leve ou licoroso, ser seco ou adocicado, aveludado ou de sabor complexo e   é graças ao suor do rosto do homem do campo e de sua labuta diária que o mundo inteiro se entrega ao prazer de degustar uma boa bebida.
          Desde os tempos pré-colombianos que os povos indígenas  cultivam o milho e a mandioca para a sua alimentação e também para produzir o cauim, bebida alcoólica fermentada apreciada  pelos nativos sul americanos.
          Água que passarinho não bebe, branquinha, pinga, a brasileiríssima cachaça é   um produto da cana-de-açúcar cultivada com muito sacrifício  e graças as mãos calejadas do homem do campo, os boêmios desfrutam  dos sabores indescritíveis desta bebida nacional.
          Abençoado seja o agricultor!


segunda-feira, 22 de abril de 2019

Missa de Páscoa





          A igreja está sempre de portas abertas para receber os fiéis e acolher os seus sentimentos, seja de alegria, quando estes  procuram a casa do Pai com o coração repleto de gratidão pelas graças alcançadas e também aqueles, que não tendo a quem mais recorrer, colocam nas mãos do Criador as suas  penúrias  e imploram  forças para continuar a carregar  a sua cruz.  A casa de Deus também é frequentada  por aquele que  estão em busca de  relacionamento sério e quer uma companhia do bem, e acredita que lá é  o melhor lugar para encontrá-la; também adentram ao recinto, em busca de lazer grátis, aqueles que estão com  saldo bancário em vermelho e precisa sair para arejar e ainda há  o que  almeja aliviar suas dores apreciando a beleza da arquitetura religiosa  tirando fotos para postar nas sociais e compartilhar uma felicidade inexistente. Seja qual for a razão da procura pelo  local sagrado, a misericórdia divina contempla a todos          
         Em um domingo de Páscoa, sem dinheiro para preparar um saboroso almoço e ninguém  para  lhe fazer companhia e ouvir a sua lamúria repetitiva, Eunice  decidiu ir Paróquia assistir a Missa e quem sabe, com um pouco de sorte, encontrar pelo menos, a sombra de seu príncipe encantado. Adentrou ao recinto santo  já com um olhar panorâmico em busca de testosterona e em menos de dez segundos viu a sua esperança murchar com a rapidez de uma caliandra do cerrado, quando cortada e colocada em uma jarra com água. Enxergava apenas mulheres: idosas,  maduras, jovens, com ou sem crianças. Sem disposição para retornar ao lar, decidiu assistir a Missa com fé e respeito e sem se dar conta, já estava refletindo sobre as escrituras sagradas e se encantou com tamanha sabedoria.
          Como reza a tradição, após a Leitura do Evangelho e antes do Credo, o Celebrante  iniciou a homilia, e Eunice sentiu como se todas as palavras fosse a ela dirigida e  finalmente, entendeu o verdadeiro significado da experiência da ressurreição e que ela acontece também  no dia a dia, como exemplo, o momento  em que um procrastinador crônico, como ela, consegue vencer a postergação da tarefa, ele vive a experiência da ressurreição e que é necessário orar e vigiar. A oração fortalece e aproxima de Deus.  Vigiar é ficar atento e enfrentar a tentação com sabedoria e que o povo  católico deve sempre almejar as coisas do céu: o amor, a justiça, a compaixão, a ética e o esforço. ódio, mesquinhez, brigas, fofoca, crueldade e a preguiça são coisas terrenas e devem ser combatidas com fé, coragem qe finalizou a prelecção orientando os fiéis que o foco deve ser sempre na solução do problema e que a ação é  um dos pilares mais importantes na  vida cristã. No final da celebração ela retornou feliz ao lar, mesmo sem ter encontrado o tão esperado amor terreno,  estava fortalecida graças ao amor divino  que lhe foram transmitidas pela palavras  do Sacerdote. 

domingo, 21 de abril de 2019

Renovar é preciso

                   
Amanhece!
Suavemente a lua cheia desaparece atrás das montanhas e com ela se vai o último fio da esperança de banhos de mar nas  frescas tardes de outono  em companhia daquele que é esperado com carinho. Ele não chegou e alegou não ter tido tempo. Mas teve tempo para passear de moto em outras companhias e também, para ficar horas assistindo séries, sozinho em casa, também disse  não ter dinheiro para a viagem, mas conseguiu para  se divertir em finos restaurantes com as colegas de trabalhos e  affair!
De onde vem esta certeza de que esperas em vão?
De  um período de três luas, em que provas irrefutáveis foram dadas, deixando claro a quem espera a certeza de sua insignificância e que desfrutar de sua companhia ao sabor dos ventos não faz parte dos planos daquele que deveria chegar.
Dos olhos cor do mar, não brotará lágrimas para juntar-se a imensidão do oceano Atlântico e pensamentos afetuosos não   mais subirão a Serra do Mar para pousar no coração  daquele  que  reside a 685 metros de altitude.
Dois feriados a esperar em vão!
Por que preencher  os dias com   um olhar angustiante no horizonte e ouvidos atento  à campainha a espera daquele que nunca chegará? É preferível desfazer-se da ansiedade e dar  espaço para solidão. Ela é viciante? Sim! Mas  proporciona paz interior,  e o seu único  efeito colateral é que  passará a ter dificuldade na convivência com as pessoas comuns.
Domingo de Páscoa! Renovação! Passagem!
É o momento propício para  preparar simbolicamente,  a partida  de tudo aquilo que poderia ter sido  para que  se perca nas brumas dos esquecimentos e aquele que negou beijos calientes,  transformar- se -a  em personagem de  uma história que será contada de geração em geração.


sábado, 20 de abril de 2019

Sábado da Aleluia


          Vinte de abril de 2019, lua cheia, sábado da Aleluia,  data  em que foi celebrada a Vigília Pascal, dia  em que  a vela do Círio Pascal, mais uma vez foi  acesa simbolizando a ressurreição de Cristo. Círio é uma palavra de origem latina cerus, de cera, resultado do labor das abelhas e que  simbolicamente, acalenta os corações dos fiéis, menos o de  Judite, que  não conseguiu perceber a riqueza  do ritual cristão porque o seu coração estava repleto de ansiedade e angustia porque não  ter recebido, há dois dias, sequer uma mensagem de bom dia de seu affair.
          Judite observava  os cinco cravos incrustados no Círio Pascal,  que simbolizam as cinco chagas de Cristo, e fazia uma comparação surreal com a sua sina de mulher  preterida.
I – A  coroa de espinhos, que os soldados romanos teceram e coloram na cabeça de Cristo, não  tinha  por objetivo somente ampliar o seu sofrimento, queriam também zombar dele, o rei dos judeus, crucificado, cuspido, insultado, espancado.  Ela sentia que também recebera a sua coroa ao se permitir viver de migalhas  de atenção de um homem, que desde o  dia  que se conheceram, deixou transparecer que o amor não era uma de suas virtudes, seu objetivo maior sempre foi  ampliar suas posses às custas daquelas que lhe entregam o coração. Sentia-se humilhada porque a sua coroa não tem  nobreza da de Jesus Cristo.
II- O prego na mão de direita de Cristo a leva a refletir  sobre a sua  incapacidade de  alcançar a tão almejada felicidade  de construir um lar ao lado de um homem honrado e dos frutos do amor, em formas de filhos.
III- O prego na mão esquerda de Cristo  lhe mostra a fraqueza  e a carência de seu coração que persiste na vã ilusão de  amar intensamente o homem errado e não tem  fé  e a coragem necessárias  para confiar suas dores ao Cristo Redentor.
IV-  Os pregos dos pés – ao observá-los, ela percebe   a sua incapacidade de caminhar sozinha  em busca de seus ideais.
V-  O corte feito no lado direito de peito de Jesus –  Assim, ela vê  o seu coração, sempre ferido com a espada do desprezos dos homens que acreditou amar profundamente. E  após esta comparação absurda,  ela percebeu  que    que a força necessária que ela precisa para  renascer mais fortalecida  está no amor de Jesus Cristo, o  filho de Deus  misericordioso que deu a sua vida para salvar a humanidade do pecado e lhe mostrar o caminho da felicidade eterna. Mais fé em Cristo e uma observação atenta  no comportamento dos homens é chave para evitar grandes sofrimentos.         Véspera da Páscoa, renascer  é preciso.

sexta-feira, 19 de abril de 2019

Filho de pescador

                 
Era uma dessas manhãs em que o céu   de abril é azul e  saudoso e   a brisa  outonal acaricia levemente o rosto dos navegantes. Do  leste, o sol aparece e mostra o seu esplendor e as águas profundas do mar   parecem estar em chamas e os pescadores, indiferente à beleza, lançam seus frágeis barco na imensidão  do Oceano Atlântico, parece que não temem a força de  Netuno, apenas esperam que a pesca seja farta e que eles possam alimentar suas famílias com o fruto de seu trabalho e assim, sem  nenhuma reflexão filosófica sobre os mistérios do mar, lançam suas redes e lutam contra a força das ondas  e vão se distanciando da  praia.
Indiferente ao esforço dos pescadores, uma criança solitária  e triste,  sentada no barco, segue com os olhos os prédios distantes, as aves  sobrevoando às águas, como a  festejar o novo amanhecer. Ser um pescador não é o seu objetivo. Almeja mais, ser comandante de  navio cargueiro, singrar mares  distantes  e depois de meses, retornar ao lar e ser recebido com  um abraço afetuoso de seu velho pai, que luta para cria-lo sozinho, sem apoio da esposa, que falecera  no  parto.
E no balançar da canoa o pequeno sonha! Um dia, no comando de seu  cargueiro, este pequeno barco será apenas uma vaga lembrança. Não temerá ficar à deriva em noites de  tempestades,o seu temor secreto. O azul do mar em contraste com o branco da espuma das ondas envolvem  o   coração sonhador, que desta vida apenas almeja um trabalho  digno e a certeza de sempre voltar para amorosos braços á espera no caís.

Fracassada


          Não é necessário  frequentar consultório de psicólogo,  psicanalista ou de terapeuta holístico  para concluir o fracasso que foi a vida de uma pessoa. Basta que ela tenha a coragem de enfrentar as suas frustrações e listar os sonhos acalentados ao longo da vida e  compara-los com os que de fatos foram realizados, em menos de cem minutos  terá uma resposta precisa.  Caso tenha faltado a  coragem para  a autoanálise, e  se  por compaixão da família e dos amigos as sucessivas derrotas nunca foram mencionadas, com certeza, não foi a melhor opção porque elas continuam vivas e na ânsia de se libertarem do peito, acabaram   sendo transformadas em doenças psicossomáticas e males piores surgirão   ao acompanhar, via redes sociais, os caminhos que a vida das pessoas que fizeram parte da infância e adolescência dela trilharam. Comparadas a uma árvore, na deles, cresceu-se galhos, desabrochou flores, nasceu frutos, enquanto  os  galhos  da árvore da fracassada, foram perdendo as folhas, uma a uma, até ficarem completamente secos.
          O peito da fracassada sangra ao ver a  postagem da filha de uma antiga vizinha,  transbordando de  felicidade, às margens do rio Sena, em Paris, não de inveja, por lhe querer mal, mas pela consciência de que não teve  a dedicação e a garra necessária para crescer profissionalmente, enquanto aquela criança, filha de um taxista e de uma dona de casa, estudante de escola pública, formou-se em medicina, em uma Universidade  Federal e já montou o seu consultório.
          Dos olhos da fracassada,  brotam  pesadas lágrimas, quando as primas de primeiro grau, compartilham as fotos dos netinhos que estão chegando e renovando a vida. Não é por maldade que ela não consegue compartilhar da alegria da família, mas pelo arrependimento de ter abdicado da maternidade  em prol do sonho de uma brilhante carreira e pela qual, não buscou o aprimoramento necessário, protelou, procrastinou e consegui apenas uma aposentadoria de dois salários mínimos.
          A apatia apossa em seu espírito fraco ao  observar as postagem de antigas  amigas e companheiras de trabalho que ficaram viúvas ou separam –se, superaram suas dores, procuram e encontraram novos amores  e no auge da maturidade se permitem serem felizes. Ela as odeia? Não! apenas  lhe  falta a força necessária para seguir em frente  e procurar um sentido para a sua triste sina, trilhando novos caminhos.

         

quinta-feira, 18 de abril de 2019

Fumaça líquida


          Não há  uma data precisa de quando homem desenvolveu a técnica de defumação de alguns alimentos  com o intuito  conserva-lo  para ser consumido em períodos de escassez ou apenas em um futuro próximo. Há  evidências  que mostram que fenícios, egípcios e gregos salgavam e defumavam peixes para transporta-los e que  a carne de bisão e veado era assim preparada pelos índios americanos.
          O processo de defumação consiste em expor a  carne salgada à fumaça, prioritariamente de carvalho e elmo  porque madeiras resinosas  comprometam o sabor  característico original do  alimento. As deliciosas iguarias defumadas são  caras e não estão  ao alcance da maioria da população  assim, as donas  de casas se vêem obrigadas a procurar alternativas similares e entre as muitas opções disponíveis no mercado  está a fumaça líquida, facilmente encontrada em   lojas de temperos e tem atraído a atenção dos consumidores mais pela curiosidade  do que pela expectativa  de acrescentar mais sabor aos pratos. Para muitas pessoas é simplesmente inconcebível  a possibilidade de haver  fumaça líquida, assim, em rodas de conversa gastronômica, já lançam o boato que  se trata de mais um produto químico lançado no mercado com o objetivo de enganar o consumidor, outros, movidos pela curiosidade,    pesquisam   os ingredientes, meio  de produção, riscos à saúde e compram para experimentar, já que a  vendedora afirma que deixa os alimentos com sabor do bacon comum.
          A fumaça líquida é um produto industrial, criado para baixar os custos dos defumados. O processo de fabricação consiste em condensar a fumaça e os vapores resultante da queima, prioritariamente  de  carvalho,  nogueira,  noz, elmo, filtra-la e engarrafa-la. Em produtos industrializados em pratos  gourmet preparados por grandes chef’s,  o resultado é o esperado, porém,   já naqueles preparados pelas donas de casas comuns e adquiridos  em comércios populares o resultado é frustrantes e o custo é maior do que o benefício.



quarta-feira, 17 de abril de 2019

Casinha Branca


          Era uma casa colonial, branca de janelas azuis,  com um pequeno jardim em frente e  uma primavera  vermelha que floria praticamente o ano inteiro. Havia também uma roseira branca  e uma mulata de sala - flor originária de Madagascar, o tom rosa que completava a  harmonia do pequeno espaço repleto de  abelhas,  beija-flores e borboletas e não raro, rolinhas faziam seus  ninhos, e, em meio a tanta beleza, criavam seus filhotes. Há poucos metros da sede, havia um pequizeiro, uma paineira e um cedro onde  o gado gostava de  apreciar o frescor da sombra enquanto ruminavam. O interior da residência, um esplendor! Mobília de qualidade e bom gosto,   no fogão a lenha, sempre havia uma iguaria  nutritiva e saborosa que era oferecida carinhosamente pela matriarca, sempre que um pequenino estômago reclamava. Neste lar onde o aconchego reinava,  um pequeno coração sangrava  em consequência  de uma tristeza que ele não sabia  a origem e menos ainda, porque ela  não o abandonava.
           Para  o coração sofredor,  em sua morada não havia beleza e era rodeada de tristeza e solidão, parecia um jardim sem flor. Assim que atingiu a maioridade, saiu em busca da alegria  em terras distantes; em suas peregrinações, descobriu apenas a  beleza das noites de  luar e vendo seu sonho perecer, sentindo a felicidade cada dia mais longe, bem além do horizonte  sentia que   os pés cansados almejavam retornar às suas origens porque já não conseguiam mais seguir a multidão em busca de  amizades ou alguma coisa que lhe proporcionasse alegria. Ás vezes, parava e ficava a observar  rostos anônimos,  e apenas percebia seus mistérios, suas dores e  desenganos.
          Depois de tanto caminhar e sofrer ele percebeu quão inútil era a sua procura,  a dor do coração sofredor  abrandou e   ele passou a desejar apenas  retornar à casinha branca de janelas azuis, para cuidar do jardim, da horta, do pomar e apreciar o  crepúsculo das tardes  frescas de outono, sentado na varanda, ouvindo o mugir do gado e o canto da seriema  saboreando uma xícara de café  porque havia, finalmente, entendido que a felicidade é um estado de espírito e não pode ser encontrada  em algum lugar, como encontra-se  um rio, uma pedra, um lobo guará.

          
         


terça-feira, 16 de abril de 2019

Assum Preto


           Assum preto é uma ave nativa do Brasil e é encontrada praticamente em todos os estados, porém, recebe nomes diferentes: pássaro preto, graúna, chico-preto, arranca-milho, entre outros. Apresenta plumagem  preta, brilhante e uniforme. São aves grupais, barulhentas e  vistas sempre em bandos  nos galhos das  árvores; onívoros, se alimentam de aranhas, insetos, sementes e apreciam o  fruto do buriti, quando maduro.  Mesmo sendo privilegiada pela natureza com uma voz melodiosa, não é uma ave  bem vista pelos agricultores porque ela desenterra  as sementes recém – plantadas  o que ocasiona mais trabalho  e prejuízos aos trabalhadores rurais, apesar deste inconveniente, inspirou uma das mais belas canções populares “ Assum Preto, de autoria de  Luiz Gonzaga (1912-1989) e Humberto Teixeira (1915-1979) gravada primeiramente pelo rei do baião, Luiz Gonzaga, e posteriormente, por vários outros, entre eles Sergio Reis, Marina de La Riva, Gal Costa...
          A canção é uma  autêntica obra de defesa   da liberdade  de todos os seres vivos, porque   de uma forma  simples  e poética, mostra o sofrimento da ave prisioneira em uma gaiola, vítima da   crueldade  e ignorância do homem, que por puro egoísmo, a   cegou,  por acreditar que assim  o seu canto seria aperfeiçoado  e  mais belo.
“Tudo em vorta é só beleza
Sol de Abril e a mata em frô
Mas Assum Preto, cego dos óio
Num vendo a luz, ai, canta de dor..”
          O canto, normalmente, é  uma expressão de alegria, mas na gaiola,  o cantar do  assum preto  é doloroso, por estar afastado de seu habitat, de seu bando, impossibilitado de  apreciar a beleza do céu de abril, o verde dos campos e de voar livremente. É uma canção que propicia  reflexões filosóficas sobre liberdade e respeito  à vida e deve ser ouvida e discutida com as crianças para que no futuro, elas não cometam este tipo de atrocidade com seres indefesos com a finalidade de satisfazer propósitos egoístas.

segunda-feira, 15 de abril de 2019

Domingo de Ramos


          Envolvida em brumas de tristeza e solidão, Rosalina não se deu conta que domingo dia 14 de abril de 2019, iniciava-se as comemorações  da Semana Santa, um dos mais belos rituais da Igreja Católica Apostólica Romana. Reza a tradição que o povo, em sua ingenuidade, acreditava que Jesus era um  político libertador, que  iria  expulsar  os romanos de Israel e devolver-lhe  a suntuosidade dos tempos do rei Salomão. Eles ainda não haviam compreendido a grandeza de seu reinado.
          Esta data comemora a entrada  de Jesus  em Jerusalém,  a cidade dos patriarcas e reis poderosos,  ele adentrou à área urbana, montado em um jumento,  com esta atitude, ele demonstrava a sua  humildade e que não era apenas mais um Messias efêmero, mas  aquele capaz de libertar o homem da raiz de todos o males: o pecado. Ele foi recebido pelas pessoas que abanavam ramos de oliveiras  e palmeiras, que significa vitória e  eufóricos, gritavam:  Hosana ao filho de  Davi. Esta tradição é revivida anualmente pelos católicos. Por um lapso de memória, em 2019, o lar de Rosalina não recebeu o Ramo Santo que faz recordar durante os 365 dias do ano que é  árdua a luta  contra o pecado mas que, com Cristo, a vitória é certa.
          Os rituais sagrados dão forças para continuar a caminhada. A  Procissão de Ramos  recorda aos cristãos que eles são apenas peregrinos na terra, que a sua verdadeira pátria é o céu e que  a fé deve ser alimentada diariamente para crescer forte como as oliveiras e um dia, com o coração leve, retornar à casa do Pai.

domingo, 14 de abril de 2019

Dia de domingo


          É domingo de quaresma! O dia amanheceu chuvoso, e sem dinheiro na carteira para ir ao supermercado comprar os produtos necessários para um almoço especial ou para ir a um restaurante  familiar, Soraia,  para não ter tempo de refletir sobre o vazio  de sua vida, opta por fazer uma limpeza  nos armários da cozinha em busca de visitantes indesejados. Enquanto abaixa, levanta, puxa e empurra, esfrega e seca, tira utensílios e os recoloca em seus devidos lugares o corpo cansa e a noite o sono chegará com mais facilidade, sem a necessidade dos remédios tarja preta.
          Ela não é adepta da tradição budista, que acredita que a limpeza do ambiente é um exercício de aprimoramento espiritual, razão essa que faz com  que os monges dedicam horas de seu dia  em faxina, sem considera-la como um fardo. Menos ainda acredita na sabedoria   popular que afirma que  varrer a casa, tirar o pó dos móveis e colocar cada objeto em seu lugar,  é uma maneira de  retirar a sujeira da alma e  harmonizar as relações domésticas e que esta atividade deve ser feita pela manhã, assim, proporcionará uma sensação de bem estar o dia inteiro. Ela o faz por solidão, por carestia, a sua condição financeira não lhe permita  preencher os seus dias em um trabalho voluntário, porque tem que arcar com os custos do transportes e um gasto a mais, está além de suas posses.
          Soraia não precisa lamentar em passar o dia de descanso, segundo a tradição judaica/cristã limpando a  cozinha porque este é um espaço sagrado  é   onde estão os temperos, onde se  trabalha a culinária  carregada de saberes ancestrais e mantê-la impecável, com certeza, ameniza os sofrimentos que foram impostos pela vida e também por escolhas erradas.


sábado, 13 de abril de 2019

Dia de feira



          Ela é presença constante  em  grandes metrópoles  e também nas cidades pequenas. A modernidade dos  hipermercados,  vendas pela internet,  não prejudicaram esta manifestação cultural urbana e a feira livre continua viva, das  periferias aos bairros nobres, frequentada pelos patrões, empregados e também pelos desempregados, estes, chegam quando ela está sendo desmontada  e recolhem produtos que foram descartados pelos  feirantes por estarem impróprios para venda mas  próprio para consumo, desde que bem manejado e assim, muitos  chefes de família conseguem botar comida na mesa enquanto batalham por  uma nova  colocação no mercado de trabalho.
           A palavra feira é de origem latina feria, e significa “ dia santo ou feriado” e freguês,   palavra usada no tratamento dos consumidores de feira livre, também é latina filiu ecclesiase, e  significa  “ filhos da igreja.” Acredita-se que a feira livre tenha surgido em torno das igrejas; após as festas religiosas, os fiéis aproveitavam para trocar mercadorias, dois dedos de prosa e aí acabavam formando laços de afetos e fidelidade àquela banca  e, sem perder sua peculiaridade de venda direta,   ela foi se adaptando aos novos tempos e não há um idoso que não tenha uma história de identidade e lembrança de uma feira, seja no âmbito de compras semanais ou lazer, para saborear  os deliciosos  e tradicionais pastéis de feira livre  e em busca de algum produto inusitado.
          É difícil resistir aos encantos da feira livre! Atendimento bom, mercadoria fresca e preços acessíveis, porém, nesta crise em que o Brasil está enfrentando  os fregueses estão sendo obrigados a abrir mão de um produto, para adquirir  outro. Sábado dia de feira  livre no bairro, Talita saiu com intenção de comprar peixe, o trilha vermelha, saboroso e barato, porém,  quando os olhos inocentes de sua filha de cinco anos, pousaram sobre o vermelho cativante das  exóticas pitaias, foi obrigada a  fazer uma troca emergencial, felizmente  estava na safra e o preço competitivo, assim, a criança pôde experimentar um novo sabor e para os irmão que ficaram em casa, conseguiu uma  oferta imperdível de atemoia, porém, teve que abrir mão das laranjas. Abdicou do pastel para levar  uma pamonha, um pequeno agrado para o marido que ficou em casa cuidando dos pequenos reparos. Quando não há dinheiro suficiente para as despesas  com alimentação, uma volta na feira  sempre ajuda, porque sempre há uma banca com um produto em  oferta e uma pessoa disposta a bater um papo  e assim, as mazelas da vida vão ficando mais leves.

sexta-feira, 12 de abril de 2019

Em busca de um trabalho


          Cinco horas da manhã! Zilda acordou com o toque do despertador. Sonolenta, pulou da cama, travou o relógio para não acordar os vizinhos, deu uma geral na casa, tomou café, se arrumou pegou a bolsa e a pasta com  várias cópias de seu currículo e saiu apressada para não perder o ônibus das  seis horas. Já na saída do prédio onde reside, uma surpresa desagradável: um tipo suspeito  na esquina da rua em que deveria entrar, assim, ela se viu obrigada a seguir pelo outro caminho, bem mais longo e viu o coletivo sumir na grande avenida. No terminal, encontrou com  a amiga, sua fiel companheira de peregrinação, nervosa em virtude de seu atraso, sem saber o que aconteceu, ambas estão com os celulares sem créditos. São arrimos de família e precisam, com urgência, ingressarem no mercado de trabalho, embora  disputem as mesmas vagas, optaram  pela companhia uma da outra  por segurança, as mulheres são os alvos preferidos dos jovens assaltantes de ruas e ambas temem perder para os meliantes, além do dinheiro da passagem, os documentos pessoais, fundamentais no momento da contratação.
          Primeira parada, primeira decepção: A  funcionária da empresa apenas anotou o nome e telefone das candidatas e informou a data  do processo seletivo, que acontecerá em 40 dias, mas as contas de água, luz, telefone, gás e cartão, não esperam!
          Segunda parada, uma  agência de emprego, indicada por funcionários temporários  de um supermercado, e segundo eles, a que mais contrata na região. A funcionária, sequer levantou os olhos para ver quem dizia boa tarde, apenas disse  para  jogar o currículo  na caixa.
          Terceira parada: Era uma vaga para empregada doméstica que além do serviço da casa, também deveria cuidar de uma criança de  quatro anos. Simplesmente não puderem concorrer porque exigia experiência mínima de seis meses. Revoltante! Cinquentinhas que  criaram seus filhos, cuidam de lares não estão aptas a executar serviços domésticos em qualquer residência? Acaso não seria melhor e mais prudente, pedir um atestado de antecedentes? Honestidade e boa vontade não são valores importantes para aquelas que adentrarão no seio da  família?
          Ao entardecer, após percorrerem o comércio e entregando na mão dos gerentes seus currículos, cansadas, famintas e com sede, retornam aos seus lares  se perguntando: Sete anos de estudos graduação e pós-graduação, não as deixaram aptas sequer para   trabalharem como balconistas de farmácias, então, estudar para quê?
         

quinta-feira, 11 de abril de 2019

Perereca


          A perereca é um anfíbio anuro  pequeno, bem menor que os seus parentes próximos e habitam  regiões úmidas e com vegetação. No Brasil existe sessenta espécies diferentes e  algumas delas são utilizadas na medicinal tradicional indígena  e também,  têm um papel importante  na cadeia alimentar porque  são devoradoras vorazes de  insetos vetores de doenças como dengue e malária. Com a invasão  humana em seu  habitat natural,  elas foram forçadas a urbanizarem e, muitas vezes, por desconhecimento ou medo, são vítimas de  furiosas chineladas.
          Em regiões urbanas onde é comum a presença deste anfíbio saltitante, principalmente  em noites  frescas de outono, assim, antes de recolherem - se ao leito, moradores  fazem  vistorias rigorosas  nas cozinhas e banheiros, lugares preferidos quando adentram nos lares.
          A questão é: como afastar as intrusas alpinistas sem levá-las a óbito para não quebrar um elo da cadeia alimentar?  A sugestão de vassoura e pá  já foi descartada faz tempo,  o salto de uma perereca pode atingir  a altura de dois metros.
         


quarta-feira, 10 de abril de 2019

A fome não pode esperar


          Não importa se seja trabalho temporário  sem direitos ou fixo com registro em carteira e todos os direitos trabalhistas.   Zilda precisa trabalhar! A fome não espera a boa vontade dos políticos decidirem  as mudanças necessárias  para gerar emprego e o país crescer.
          Embora tenha curso universitário, este grande investimento não tem lhe ajudado a encontrar um serviço, mesmo que simples, como recepcionista, operadora de caixa,  auxiliar de escritório.  Eles exigem experiência!   E com tristeza, constata que  boa formação, experiência em  administrar o parco orçamento doméstico, educação de filhos,  não são valores considerados no momento da contratação. Ela ficou fora  do mercado por vinte anos, por opção, para cuidar da  família, porém, com a reviravolta da vida, ficou viúva,  e precisa trabalhar,  com disponibilidade de tempo  e disposição é rejeitada no mundo do trabalho, mas a fome não pode esperar.
          Todas as noites, o mesmo ritual: arruma  a roupa, separa o dinheiro da condução, os documentos, um lanche, a garrafa de água, precisa economizar, não pode aumentar os gastos com alimentação. O dia amanhece e lá vai ela em sua peregrinação porque a fome não espera, tem hora certa para chegar todos os dias.