terça-feira, 31 de março de 2020

Diário do isolamento social 14ºdia

                          E lá se foi mais um dia que não deixará saudade. Que recordação terei desta monotonia? Em 31 de março, da década de 1970, não sei precisar o ano, mas recordo bem o acontecido.  Minha avó paterna esteve em casa e convidou-me para um passeio, somente vovó e netinha, desculpa para uma suave orientação sobre uma paixonite que eu tinha,  com o intuito de abrir os meus olhos para que eu não me envolvesse  com um homem, cujo histórico familiar era de violência doméstica contra as mulheres: esposa, filhas, noras, não escapava nenhuma. Como  a paquera chegou aos ouvidos da matriarca da família? Claro que pela minha irmã mais velha, a pessoa mais fofoqueira e dissimulada que eu já convivi em toda a minha vida. 31 de março de 2020,  eu não recordarei, porque não há o que lembrar, apenas mais um dia em isolamento social.
            Tenho abstido de ver televisão e olhar mensagem de redes sociais, ainda tenho um pouco de disposição para ouvir o noticiário do rádio e, como é de rotina em tempos de paz e guerra  na capital paulista, bandidos encontram um meio de extorquir a população, se não dá para assaltar na rua porque poucas pessoas estão circulando nas ruas,  como comprova  os registros dos terminais de ônibus de Tiradentes e Pinheiros, que   estão rodando com apenas 30% de usuários, assim, a turma do mal, procura outros meios,  estão partindo para o arrastão em condomínios, disfarçados de agentes de saúde alegando estar fazendo vistoria em domicílios para prevenção do Covid 19. O repórter orientou bem a população que as unidades de saúde não prestam este serviço, e este foi o meio mais fácil que eles pensaram para saquear, sem muitos esforços, os apartamentos. Nem em tempos de pandemia  as pessoas de bem podem descansar em paz no recinto sagrado de seu lar.
            É notícia velha, mas soube hoje  que no  dia 24 de março, o governador Dória,  informou que os detentos do sistema penitenciário de São Paulo vão produzir 320  mil máscara de proteção contra o  Covid 19, em TNT  e serão vendida a R$0,80. Hoje o Ministro Mandetta confirmou que elas são eficazes e que podem ser lavadas e  reutilizadas. A  minha dúvida é:  Estas máscaras, produzidas pelos  presidiários passarão por uma lavagem, esterilização, ou será de responsabilidade do  usuário, lavá-las antes de usá-las?  Eu confeccionei uma para mim, com  um pedaço da minha toalha de  natal, de TNT,  não fará diferença, e depois,  eu não tinha opção,  lojas de tecidos estão  fechadas, o natal está longe e eu preciso dela  é agora.  Precisamos nos proteger,  o Brasil  já registra 201 mortes em decorrência do vírus que chegou com força e ainda estamos no outono.
Terça – feira, 31 de março de 2020
20h03min
Temperatura 29º graus
Umidade relativa do ar 70%
E eu estou ouvindo música celta para relaxar  e esquecer a monotonia deste dia.

segunda-feira, 30 de março de 2020

Diário do isolamento social -13º dia

                 
            Um lindo crepúsculo colore  o céu e mais um longo dia se finda. E fazendo uma retrospectiva, foi apenas mais um dia como outro qualquer, de qualquer pessoa que está privada de sair para apreciar as frescas tardes do outono brasileiro.  Eu amo o outono! Nem muito frio, nem muito quente e caminhar sem destino, sentido  as brisas outonais é um pequeno prazer que não posso desfrutar  durante esta pandemia.
            Apesar da escassa chuva noturna, o dia amanheceu ensolarado e eu acordei  do torpor que  tinha abatido sobre mim deste que iniciei a leitura de Crônicas do Pássaro de Cordas.  O café da manhã foi bem reduzido,  apenas  um pouco de aveia com leite e café preto. Acabou o meu estoque do cereal e  amanhã terei que improvisar um desjejum com o que tiver em casa.  Tomei um banho revigorante  que lavou os últimos resquícios  da falta de iniciativa do personagem do livro e espero que para sempre. Estudei um pouco de inglês para viagem, seguindo rigorosamente o meu roteiro de estudo – leitura dos capítulos anteriores mais um e, li também, mais um capítulo do livro de cibernética,  ainda continuo  não entendendo nada, mas não estou com a  disposição para a leitura de aprendizagem, quando lemos, relemos, grifamos e resumimos,  leio para passar o tempo e pelo desaforo de ter gastado tanto dinheiro em livros para apenas ficar na estante colecionando  traças, ácaros e poeira. Com os olhas cansados das letras pequenas,  decidi exercitar o cérebro e  assisti uma aula de matemática  on-line, destas gratuitas que o  youtube disponibiliza, faltou a disposição para fazer a atividade no caderno, quem sabe amanhã. Ainda estou que meio anestesiada  de tanto ficar em casa  repousando, e  o agravante é que a ociosidade  atrofia a mente, perde-se a  capacidade de sonhar,  a vontade de planejar, de interagir virtualmente com as pessoas.  Preparei o almoço, lavei a louça e hoje, finalmente, eu consegui fechar a gaveta da cômoda, limpar a casa e descer o lixo. Prenúncio de que irei vencer este marasmo que  abateu sobre mim.
            Praticamente não tenho ligado a TV, mas o pouco que assiste a notícia foi  boa, há uma esperança para um futuro próximo, a cura para as vítimas do Covid 19,   remédios estão sendo testados com sucesso. Cansada da TV, liguei o rádio e, nestes programas populares, que nem lembro mais em qual emissora, o locutor atendia chamadas de caminhoneiros que  relatavam as dificuldades que estão encontrando, principalmente no estado de São Paulo, para conseguir alimentação, assistência mecânica  e para a saúde. Estão tendo dificuldade até para conseguir um remédio para febre, dor de cabeça, nas costas, além do risco que estão correndo, quando estão na fila, em alguns postos de gasolina, para pegar  o marmitex,  a popular “quentinha” e nas filas para descarregar  em  seus destinos finais. Outro aspecto destacado por eles é a vulnerabilidade com que os funcionários  dos pedágios estão trabalhando, sem máscaras, luvas, recebendo dinheiro e entregando  troco a  pessoas de todo o Brasil.  O vírus  é resistente e vive muito tempo em notas e moedas. Está aberração não e´ fake news, soube através de uma   emissora de rádio séria,  a notícia que já há pessoas inescrupulosas  importando da China remédios e vendendo com preços abusivos para pessoas ingênuas e também que já está circulando no WhatApp, site falso para pegar dados das pessoas que serão beneficiadas pelo programa de assistência aos  mais necessitados. Roubar de quem já não tem  praticamente nada, é o ápice da maldade humana. Também circula em redes sociais, que até pessoas que  morreram em virtude de acidentes, como o caso de um borracheiro, acho que no Pernambuco, o atestado de óbito foi emitido como vítima de  Covid 19. Será verdade? Entre tantas notícias ruins, uma boa, o Programa Bom Prato,  criado em dezembro de 2000 pelo governador o do Estado de São Paulo, Mário Covas, com objetivo de oferecer, à população de baixa renda, refeições saudáveis e de alta qualidade a custo acessível terá o seu horário e serviço ampliado. Servirá café da manhã por R$0,50, almoço e janta por R$1,00, porém, com talheres descartáveis, o que causará um grande impacto ambiental porque não sabemos por quanto tempo está medida  permanecerá  ativa. Em tempos de pandemia,  a certeza que se tem é somente do agora. Vamos esperar com resignação e precaução.
 Segunda - feira, 30 de março de 2020
20h 30 min.
Temperatura 29º 
Umidade relativa do ar 69%

domingo, 29 de março de 2020

Diário do isolamento social 12ºdia

                                     Hoje  o dia amanheceu ensolarado e eu saí da cama cedo, não pude protelar nada porque tinha reunião de condomínio ás 9horas para eleição do  novo síndico.   Em uma situação crítica como a que estamos vivendo, com o  crescente avanço do Covid 19, achei um absurdo ter mantido a reunião, porém,  o representante da administrada informou que tinha que acontecer pois vencido o mandato, o banco cancela a conta e problemas maiores surgirão. É difícil acreditar que uma empresa especializada em administração não saiba conduzir uma  reunião séria, sequer seguiram a pauta. Foi sofrível! Para participar,  prendi os  cabelos, coloquei turbante, máscara e sentei, o mais isolada possível, as cadeiras  foram posicionada em uma distância razoável. Retornando ao meu lar,   tirei a roupa  que foi direto para a máquina, tomei banho.  Este ritual de deixar os sapatos na entrada, a porta aberta, lavar as mãos, voltar e passar álcool gel na maçaneta, na chave e na bolsa, está me deixando neurótica.
            O transcorrer do dia foi normal, apenas as atividades relacionadas   com a alimentação. Estou acometida de  uma inércia, uma vontade de não  fazer nada; faz três dias que não limpo casa e a gaveta  da cômoda, que por distração deixei aberta,  continua aberta, o grampo de cabelo que caiu em baixo da cama, lá está ele à espera de retornar ao conforto da caixa, junto aos companheiros, vejo as atividades a serem feitas e não sou capaz de executá-las. Outro fator deprimente é que nem posso refugiar-me  na cozinha, preparando pratos diferentes porque tenho que poupar os alimentos estocados.  Sair  está cada dia mais perigoso, principalmente para as idosas, as que são mais orientadas a ficarem em casa e se saem á rua,  são alvo fácil. Recebi o telefonema de uma amiga que reside em um bairro próximo ao meu e estava bastante assustada!  Ela mora em uma casa térrea, sozinha, como não tem nada a fazer fica  várias horas do dia olhando o movimento da rua e  tem notado uma movimentação suspeita de ciclistas que passam devagar, várias vezes ao dia e observando  as residências, provavelmente estudando uma  maneira fácil para  invadir. Ela também disse, que ontem a tarde,  avistou, na entrada do mercado carros de polícia e   mais um seis policiais montados em elegantes  cavalos. Bem estranho, a cavalaria  somente é vista em dias de megaevento, o que poderá ter acontecido? A mídia tem priorizado o noticiário sobre o Covid 19 e ainda não sabemos com precisão se nestes dias de quarentena,  a criminalidade tem aumentado, principalmente  roubos em residências, porque na rua, está mais difícil, em virtude da escassez de pessoas circulando.
            Espero que amanhã eu esteja  mais animada, com disposição para limpar a casa e a alma. Hoje terminei de ler  o livro do escritor japonês Haruki Murakami, Crônicas do Pássaro de Cordas. É um livro muito interessante, envolvente, porém, acredito que  eu tenha absorvido um pouco do estado emocional do protagonista,  que  é um sujeito sem ambição e  garra. Como eu já tenho  uma pré-disposição  inata para a procrastinação,  por menor que seja o estímulo, eu já quero deixar tudo para depois de amanhã, porém, o depois de manhã não chega nunca.
 Domingo,29 de março de 2020
Temperatura 28º graus
Umidade relativa do ar 75%

sábado, 28 de março de 2020

Diário do isolamento social11º dia

                           
            Este início de outono está mais que o verão. Ainda estou com o ventilador ligado e   talvez tenha que dormir com ele funcionando toda a noite. O dia  transcorreu sem mais  maiores transtornos, porque sozinha e em quarentena, é difícil acontecer alguma coisa. Uma vizinha  me chamou para ir ao mercado com ela, inventei  que estava com diarreia, assim ela não insistiria, falar que está em estado febril, dor de cabeça, estas desculpas de sempre agora faz com que a gente caia na boca do povo e todos acreditarão que estamos contaminados. Não fiz por maldade, por falta de solidariedade, mas porque estou  evitando sair com ela em virtude de  seu comportamento   que não condiz com a minha maneira de agir, acredito que um pouco de recato e discrição faz bem em todas as idades e, não é porque somos idosas e sozinhas que devemos estar disponíveis para todo cidadão que aparece. Aparentemente ela acreditou na desculpa e não  me aborreceu mais com seus assuntos repetidos.
             A grande novidade foi que  outra vizinha veio trazer-me  mantimentos, que ela ganhou do cunhado, porque ele e a esposa recebem cestas básicas e, como são somente o casal, sobra muita coisa, e optam por dividir com ela. Fiquei feliz com a oferta, assim aumentaria o meu estoque de alimentos e evitaria sair à rua, porém, quando fui higienizá-los para guardar, observei que  a metade  deles estavam vencidos, uns  desde 2019. A dúvida  é: foi de propósito ou mera distração? Como não sei a verdade, nada comentarei. Depois dos setenta anos,  se aprende que quanto menos falar melhor, e quanto mais agradecer, melhor ainda.
            Fora isto, nada mais aconteceu, apenas atividades relacionadas à alimentação  e o marasmo de sempre. Sinto  que a apatia está  chegando aos poucos,  não tenho vontade de cuidar de mim, da casa, de olhar mensagens das redes sociais, telefonar para  amigos. Continuo a ler o romance não mais com o entusiasmo do início e somente não o deixo de lado, simplesmente porque não tenho disposição para fazer outra coisa, como um curso on-line, estudo de  uma língua estrangeira, um tricô; até descer o lixo já  deixa-me bem cansada.
Sábado, 28 de março de 2020
21h 43 min
29º graus
Umidade relativa do ar 70%

sexta-feira, 27 de março de 2020

Diário do isolamento social -10º dia

                        E nada aconteceu no recinto de meu lar. Lá fora os acontecimento eram de um mundo distante,  assustadoramente distante; sons de carros, pássaros, vozes ao longe, sol e nuvens brancas  no céu e  apesar do termômetro marcar temperatura alta,  não senti calor, nem nas horas mais quente do dia, parece que  o frio se instalou  dentro mim. O que eu fiz hoje? Nada além das atividades relacionadas a alimentação e  a leitura de um romance, cuja impotência do personagem perante a necessidade  de labutar a vida  se abateu sobre mim e assim passei mais um dia em quarentena solitária e triste sem poder sequer, desfrutar de um passeio ao ar livre.
27 de março de 2020-03-27 20h17min.
Temperatura 29º graus
Umidade  relativa do ar 65%

quinta-feira, 26 de março de 2020

Diário do isolamento social - 9º dia

                             
            Foi  assustador!
Hoje tive que sair à rua para ir ao banco retirar dinheiro, fazer recarga no celular e comprar laranja e ovos. Como eu moro em bairro  residencial, afastado da área comercial, não    existe nada a menos de  um km de minha  casa e sem condução para a avenida principal onde fica a agência  bancaria. Vesti uma roupa surrada, coloquei a máscara caseira, na expectativa de   manter os transeuntes distantes de mim.  Organizei-me para sair exatamente às 14 horas, com o sol a pino  na expectativa que os raios fortes fritasse o Covid-19  diminuindo assim a possibilidade de ser infectada. Tive meu  primeiro susto ao sair do meu condomínio  porque já avistei ciclistas com atitudes suspeitas. Firmei  o pensamento em Deus, forcei tosse seca e espirro e acelerei  o passo.  Para evitar uma neurose, tenho evitado ouvir noticiários e ler as mensagens de whatsapp e já levei o segundo susto: o banco estava fechado, somente os caixas eletrônicos estavam disponíveis, por sorte havia um carro da Polícia Militar no estacionamento. Fiz o saque rápido e saí apressada para ir à farmácia. Foi uma caminhada tensa, de aproximadamente uns dois km. Efetuei a recarga e  retornei rápido rumo a padaria.
            Ao  dirigir-me ao caixa da padaria, já levei o meu terceiro susto, como o movimento estava muito fraco, as funcionárias conversam em alto e  bom tom, assustadas, comentando a última noticia: os saques em  supermercados e não são fake news porque elas conhecem a comerciante que foi vítima. Saí apressada e fui ao mercadinho para comprar ovos e pedir o  número do telefone para fazer pedidos de entrega, porém, fui informada que somente acima de trinta reais. Uma pessoa sozinha, comprar trinta reis em verduras é jogar dinheiro fora. Eles  não dispunham da mercadoria e tive que retornar à padaria e voltando cabisbaixa, fui abordada por um jovem pedindo dinheiro, disse que não tinha e perguntei se estava com fome, eu tinha um pão a oferecê-lo, porém, ele simplesmente  virou-me as costa e eu segui e frente o mais rápido que pude. Ao virar a esquina de minha rua, pela primeira vez fique feliz em ver o meu eterno fã, um senhor casado, que vive convidando-me para sair, claro que recuso e evito passar em frente a casa dele para evitar complicações, porém, hoje foi diferente, eu estava assustada e com medo, cruzando sempre com ciclistas, motoqueiros com garupa e   pedintes, e um senhor, sentado em frente a sua residência,  naquelas circunstâncias, representava um porto seguro. Com a graça ao Misericordioso, cheguei ao meu condomínio   segura, com o meu cartão de crédito na bolsa. Encontrei com uma morada do meu andar, conversamos  um pouco e ela  aparenta  estar em perfeito estado de saúde  físico e mental, o que deixou-me intrigada,  ontem, uma moradora do último andar, entrou em contado comigo para avisar para que eu tomasse cuidado porque ela estava contaminada com Covid-19 e internada. Mistério!
            Talvez eu esteja  ficando paranóica,  mas deixei os sapato na entrada,  tomei banho, lavei cabeça e a roupa que usei, joguei fora todas as sacolas e embalagens, desinfetei bem minha compra e minhas mãos, quando pego o celular, arrisquei olhar algumas mensagens e vi uma que está falando  que os motoristas, revoltados com a falta de comida e demais assistências nas estradas, irão aderir a proposta do governar e ficar em quarentena.  Misericórdia Senhor! Até ovos está difícil de encontrar, o que será de nós, seus  humildes servos?
26 de março de 2020,
20h 27 min.
 Temperatura, 28º graus
Umidade  relativa do ar 60%

quarta-feira, 25 de março de 2020

Diário do isolamento social - 8º dia

                              Dizem que todas as mudanças trágicas na vida das pessoas   passam por cinco fases e  neste   meu recolhimento  domiciliar  forçado, acredito que já estou na última, a da aceitação. Olhando agora, percebo que passei por todas. A primeira - a  negação. No  início, quando o governo   colocou em quarentena, os brasileiros  resgatados da China, pensei que  não haveria contaminação em massa no país. Não me preocupei em estocar alimentos,  retirar dinheiro no banco. Confesso que fiquei obcecada, ouvindo ás noticias, como a esperar que nada fosse acontecer. Mas aconteceu. Depois veio o segundo estágio – a raiva -  Esta fase começou quando  comecei a  receber mensagens dos  lugares sociais que freqüento, como academia,  avisando que o atendimento estava suspenso temporariamente. O terceiro estágio – a negociação. Aconteceu  comigo mesma, negociando as mudanças   que  precisavam ser feitas para  eu não ser contaminada,  melhorar a minha imunidade e para isto, fez-se necessário trocar comida saborosa por  uma alimentação saudável, novos hábitos de higiene.   O quarto estágio – a depressão – Esta quase  pegou-me, tive uns momentos de terrível desânimo  e  fui salva pelo  livro:  Crônicas do pássaro de cordas, de Haruki Murakami. Fazia tanto tempo que eu não lia um romance, tinha  esquecido de como é bom viajar sem sair do lugar,  em um diálogo  contínuo com  os personagens,  exercitar a imaginação porque  a edição não contém imagens e fico a criar os ambientes em minha mente. Agora estou na última fase, a da aceitação do fato. A pandemia  é uma realidade e eu terei que adaptar-me as orientações dos   governo  e demais profissionais de  saúde.
            Tenho evitado ler mensagem de WhatsApp, porém, uma  mensagem chegou até mim, oriunda de  uma pessoa que não é atuante  em redes sociais, razão pela qual abri e  assisti o vídeo. Era um caminhoneiro, relatando as dificuldades que eles estão encontrando pelas rodovias para conseguir fazer as refeições porque   muitos restaurantes e lanchonetes, estão fechados, alguns estão passando fome, transportando alimentos por este mundão de Deus. Pelo que eu entendi, a Vigilância Sanitária esqueceu  que motorista não é peça do carro, é um ser humano    e precisa se alimentar.
            Hoje  recebi a visita do síndico e do zelador,  eles vieram trazer uma máscara, confeccionada à mão, pela  sua esposa e álcool gel. Apesar da preocupação deles, com os idosos do condomínio, acredito que não será de grande valia, primeiro porque  eu duvido que estas senhoras preguiçosas que aqui residem, irão se preocupa em lavar com sabão e colocar a máscara ao sol, o melhor bactericida que existe, depois, o  álcool, está com o grau inferior ao indicado pelos profissionais da saúde. Mas fique feliz com  o cuidado deles, lembrando que até agora, não recebi uma mensagem de nenhum parente  mais jovem, oferecendo ajuda.  Em meu círculo de amizades a situação é difícil, todas estão acima dos 65 anos de idade, ou seja, vulneráveis.  Aos janeiros, acrescenta-se diabetes, pressão alta,  todas as  doenças terminadas ite, portanto, não podemos cuidar umas das outras. Quanto mais  distante  melhor para todas.
            Os alimentos estão acabando. Verduras não  há uma folha sequer em minha geladeira,  o último ovo,  virou omelete para o  jantar de hoje. A proteína de soja durará somente para duas refeições e abri o último pacote de feijão.  Pão, biscoito, bolachas, leite, nada disso tem mais. Para o café da manhã,   apenas aveia  e água  e café preto.  Amanhã terei que ir ao banco, comprar algum mantimento,  colocar crédito no celular e  pedir o cartão de visita do mercado, que eu, na fase da negação, joguei fora, quando eles gentilmente ofereceram  os serviços de entrega na  redondeza, quando ainda era uma especulação, o isolamento vertical de idosos e demais grupos de risco.  Quando tudo passar, porque vai passar, procurarei as amigas mais espertas do que eu e  pedirei ajuda para aprender  a usar aplicativos de banco, cada dia estarei mais frágil e mais abandonada  pelas novas gerações  e também  pela minha geração que irá para a sua  última morada, a fila está andando.
25 de março de 2020 – 20h02min. Temperatura 28º graus e umidade relativa do ar 56%

terça-feira, 24 de março de 2020

Diário do isolamento social 7º dia

               
            Apesar do susto de ontem, hoje acordei melhor, sem vestígios de febre e com  mais disposição para efetuar algumas tarefas domésticas. Movimentar me faz muito bem. Lavei tapetes,  varri e  passei pano  com água sanitária,  o apto está um primor. Depois que terminei tudo, a campainha tocou, era o Zelador,  veio entregar o boleto do condomínio e avisar que a reunião para eleição do  novo síndico não foi cancelada, acontecerá no  domingo. Achei um horror! Em um condomínio onde os proprietários são  majoritariamente idosos, reuni-los  em um pequeno recinto fechado, com pessoas   da administrada  é, em meu entender, de uma grande irresponsabilidade. Mas não protestei, estou sem forças para isto, tantos dias dentro de casa  mina as forças de qualquer cidadã acima dos 60 anos. Findo  o trabalho do funcionário, o interfone não parou de tocar, moradores aflitos com a perspectiva de um aumento  do valor do condomínio, nem sei se é pauta Sei  que fui irresponsável ao jogar fora, sem ler a convocação, prestei atenção somente no dia e horário. Fui ingênua, tudo que acontece  no  prédio, recai sobre o meu bolso.
                 O isolamento social fez-me mais observadora da natureza que está ao alcance de minha vista, pela pequena janela do meu quarto. Nunca tinha prestado atenção em quão belo é o céu de abril, um azul único, quebrado aqui e acolá por nuvens brancas e vez  ou outra, cruza a imensidão pássaros felizes, sem a consciência do que a humanidade está  sofrendo, uma pandemia, uma  peste que veio para lembrar- nos que somos seres humanos e que precisamos uns dos outros e, pior, o que acontece a um, recaí sobre todos. Assim é a lei da natureza, somos todos dependentes uns dos outros. A quarentena  aquieta o corpo e acelera a mente, o  pensamento voa e fica difícil acompanhá-lo. Penso no pequeno produtor rural, aquele que prepara a terra, semeia, cuida  e colhe o alimento que nos mantém vivos e de pé. Se o vírus  chegar ao campo  e dizimar a população rural, tão desprovida de assistência sanitária e médica o  que será dos citadinos, como eu, que faz mais de 20 anos que não coloco meus pés sobre  a terra , tudo concreto. Precisamos deles para viver!  Antes do confinamento, nunca tinha refletido seriamente sobre a dependência da cidade do  campo, dos  profissionais dos transportes, dos atacadistas, dos profissionais da saúde, da limpeza urbana, das usinas de energia elétrica, são tantos e tão distantes de nós, mas precisamos deles para  viver. Que assistência estes profissionais   estão recebendo do governo?  Sem eles  todos  perecerão de  inanição ou peste.
            Este inimigo invisível veio para nos  ensinar humildade, de nada adianta o dinheiro, se  não tem a força de trabalho para produzir, e são as pessoas simples,  muitas vezes, com pouco estudo,  que trabalham muito e recebem pouco, a força motriz que faz  girar a roda do capitalismo. A estes profissionais  essenciais, o meu  sincero agradecimento.
            São 18h28min de 24 de dezembro de 2020 Temperatura de 28ª graus, umidade do ar, 57%  e eu estou feliz porque estou viva e assim quero permanecer, sem nenhuma doença, o sacrifício  a de  ser válido.

segunda-feira, 23 de março de 2020

Diário do isolamento social - 6º dia

                         
            Estou assustada!  À tarde senti um cansaço inexplicado, tirei um cochilo e acordei  com um mal estar, parecido  com estado febril e já fique preocupada  com medo de estar com  Covide 19. Existe também a possibilidade de ser dengue, estou toda marcada com picada de pernilongo. Não sei mais o que fazer para dar sumiço em um que me atormenta desde que para cá mudei e ele não respeita incenso de citronela, inseticida, alfazema, ventilador, repelente. Tenho tentado de tudo que a ciência e a sabedoria popular afirmam ser armas fatais contra o intruso,  mas nada o faz cair por terra. Dizem que  ele vive apenas trinta dias, mas o daqui já tem é três mil dias. Enfim, voltando a minha preocupação inicial, posso estar contaminada com  um ou outro mal, mas hoje não irei procurar ajuda médica, tenho medo de entrar ruim e sair pior, ou até nunca mais voltar.
            Mais uma vez farei uso da tradição, tomarei bastante água, tomarei um banho quente e na seqüência aquele chá de alho bem quente para  suar bastante. Sempre foi assim em minha família, qualquer sintoma de gripe, chá de alho e cama. Repouso é  o que tenho feito e hoje,  um funcionário do prédio interfonou  para transmitir um recado do Síndico, para avisar que quando precisar de alguma coisa, que ele providenciará, ou seja, até a chance de  sair para comprar alimento me foi tirada.  É uma atitude de cuidado  com os idosos e sei que tenho a agradecer, mas a rebeldia de adolescência já está gritando dentro de mim  e eu preciso controlá-la para o meu bem e dos vizinhos. O que tenho em casa espero que dê até sábado, quando acontece a feira do bairro e com humildade e gratidão  irei pedir ajuda  e preservar a minha vida. Ser idosa é bom, pena  que temos que lidar com a fragilidade do corpo.
            São 20h00 min, um início de noite fresco, apenas 28º graus e umidade do ar 57%. Ainda não choveu, mas por precaução irei fechar todas as janelas para evitar corrente de ar, estou confiante que o chá de alho irá  vencer vírus e bactérias que tentam adentrar em meu corpo cansado de não fazer nada, apesar deste mal estar, tentarei ler mais um capítulo do livro e quem sabe eu consiga entender o que é cibernética.
23 de março de 2020- Pátria Amada, Brasil

domingo, 22 de março de 2020

Diário do isolamento social – 5º dia

                                   
            
         São 18 h e 11 min. Um vento  fresco  deixa  suportável a  temperatura  no interior da minha  residência, não sendo necessário ligar o ventilador  para  suavizar os 29º graus  e a umidade relativa do ar de 59%, o que deixou a minha respiração difícil, mas estou tranquila,  acredito não estar com o vírus covide 19, o mal estar é consequências das atividades realizadas hoje. Para quem está em confinamento, um dia segue o outro e não se faz distinção dos dias da semana e o serviço doméstico vai sendo executado de acordo com a disposição, tanto faz se é quarta-feira ou domingo.  Hoje acordei com o intuído de  vencer a preguiça e até que consegui, lavei a roupa de cama, limpei   e  organizei as gavetas da cômoda e do guarda-roupa e   varri a casa, não consegui  passar pano, estava muito cansada. Bem diz o ditado popular que  a ociosidade é  mãe de todos os males, uns dias sem caminhar e ir à academia e já   fico exausta com tudo, um cansaço físico e mental que não  justifica-se,  um marasmo sem limite, preciso lutar  e movimentar do banheiro para os quartos, dos quartos para a sacada, da sacada para a cozinha e da cozinha para a área de serviço, e agarrar-me com o que está a minha disposição,  o rodo, a vassoura, o balde, o tanque e a pia. Preciso movimentar, senão terminarei  esta quarentena,  com uma depressão profunda que poderá levar-me a morte por inanição. Agradeço a Deus por ter conseguido executar estas pequenas tarefas e amanhã  farei mais, dizem que arrumar as gavetas faz com que arrumemos também o nosso interior,  verdade ou mentira, não sei dizer, mas estou me sentindo bem melhor.
            Encontrei na internet um vídeo de uma  linda canção indígena de cura, estou ouvindo enquanto escrevo, com fé nos meus ancestrais, passarei ilesa por  esta  pandemia. O céu está lindo!  O dia está despedindo-se com  um lindo laranja, prenúncio de um amanhecer ensolarado o que é muito bom, não somente pela alegria que o sol transmite,  mas, principalmente porque o covide 19 não  é muito resistente ao calor oriundo do astro rei, assim diz os especuladores de plantão.
            O efeito colateral da quarentena é o estresse oriundo do excesso de tempo para prestar atenção em tudo o que acontece no prédio, a música irritante de um morador, as conversas vias interfones entre vizinhos, o barulho  das maquinas de lavar, de liquidificador e  gritaria  das mães com as pobres e indefesas crianças, confinadas nos aptos,  sem poder usufruir das áreas comuns. O crepúsculo de outono convida para um passeio, mas não posso sair, a programação da  televisão aberta é  cansativa, vou providenciar uma salada, um banho e um chá calmante e tentarei dormir e espero de coração que a moda dos panelaços não chegue ao meu bairro.

sábado, 21 de março de 2020

Diário do isolamento social 4º dia

               
                       São 21h  34min , a noite está mais fresca, 28º graus e a umidade do ar 67%. No decorrer do dia, choveu esporadicamente, chuva leve e fina e  o dia findou com um belo crepúsculo que pôde ser apreciado somente pela janela. Hoje acordei  mais tarde e cansada porque dormi poucas horas, após o post de ontem,  sem sono e angustiada assisti, pela internet, a novela: As aventuras de Poliana. A que ponto que chega uma idosa enclausurada, perder horas de sono com uma trama infantil, inspirada num grande clássico da literatura universal. Apesar de a novela ser bem moderna eu gostei, artistas bonitos, papo jovial  e fez-me recordar dos meus tempos de estudantes, quando a realidade era bem diferente.
            Após  o café da manhã,   mais um capítulo do livro e continuei sem entender nada. Sem  poder sair de casa, os dias são longos e tristes, e para alegrar o meu  sábado sem pastel da feira, vasculhei  o armário da cozinha e encontrei um pote de pequí em conserva, mas faltou o arroz arbóreo para preparar um delicioso risoto,  assim, fui obrigada a improvisar a receita com  o que tinha,  não o ideal, porém, ficou saboroso. Enquanto  lavava a louça, ouvia o pronunciamento do  governador  Dória, que decretou  quarentena de 24 de março   acho que 07 de abril de 2020.  Por ser do grupo  mais vulnerável, já estou  no quarto de isolamento  social por orientação dos profissionais de saúde, agora, do determinação do governo. Ainda tenho  mantimentos para uma semana,  e estou bastante receosa de  sair às ruas porque o comércio que não pertence ao gênero alimentício está  fechado e são dois quilômetros  para andar sozinha de minha casa até ao supermercado mais próximo e ficar só no ponto de ônibus  é tão perigoso quanto andar solitária  pelas avenidas.  Convidar  uma vizinha para ir junto não é uma boa opção porque a distância  que temos de ter de uma pessoa da outra   é de dois metros e é difícil fazer uma idosa  recém saída da prisão entender isto. Chamar motorista de aplicativo  encarece a compra.
            Estou com medo  de ser contaminada e perecer à míngua em um leito de hospital a espera de respirador,  do sofrimento característico de  toda doença,   da solidão de morrer sozinha  ou de ficar jogada em uma cama, queimando em febre, sem uma pessoa para colocar uma compressa de água fria na testa  para abaixar a temperatura do corpo. Já estou saturada de  mensagens de whatsApp, meus olhos estão  das letras pequenas dos livros e da luminosidade da tela do computador.  Estou cansada de ficar presa em meu próprio lar. Durante minha vida laboral, trabalhei muito e tudo que eu mais almejava era ter tempo para ficar em casa, agora que tenho todo o tempo para  curtir o meu lar, eu quero sair, nem que seja para dar uma volta no quarteirão.  Tenho muitas tarefas a  fazer como  limpar o guarda – roupa, o outono chegou e com ele o companheiro inseparável: o mofo. Quero  atacá-lo,antes que ele invada todas as gavetas, não posso  lavar semanalmente  todas as roupas da casa porque  preciso economizar o sabão em pó que tenho em  estoque. É prudente permanecer no recinto sagrado do lar até segunda ordem. Deus, dê-me forças para suportar o cativeiro e determinação para realizar as tarefas domésticas.

sexta-feira, 20 de março de 2020

Diário do isolamento social – 3º dia

                     
            
             São  21h30min, quinta –feira, 20  de março de 2020, temperatura marca 29º. O outono chegou com uma chuva fina, silenciosa e esporádica  o que facilitou bastante porque tive que ir ao centro pegar um  documento no cartório, uma pequena gentileza para um amigo que não pôde fazê-lo porque mora em outro município e a rodoviária está fechada. Apesar de ter ônibus circulando, eu preferi solicitar um motorista de  99, que é mais barato que o Uber; portando documentos originais,  fiquei receosa, não somente com  o risco de contagio pela proximidade das pessoas  dentro de um transporte público,  mas principalmente dos fugitivos da  prisão, que devem estar ávidos para  limpar os  idosos que estão nas ruas. Por mais inexperiente que seja o ladrão, ele sabe que em situação de  pandemia,   os aposentados que estão nas ruas não é para desfilar pés-de-galinha, rugas, manchas sênior,  varizes, estrias e celulites, mas porque têm algo importante a fazer e podem estar portando dinheiro ou alguma outra coisa de valor.
            Durante o trajeto, observei quão vazia está a cidade,  muitas lojas com suas portas fechadas e  dos poucos transeuntes, a metade apresenta atitude suspeita. Agradeci a Deus ter retornado ao meu lar, com a missão  cumprida e sem passar por nenhum dissabor.  Cheguei  cansada, sem disposição para as tarefas de rotina, para estudar o meu inglês; tentei ler o livro de Norbert Wiener “ Cibernética  e Sociedade – o uso humano de seres humanos, edição antiga, de 1954. Não  consegui concentrar  na leitura porque não  estou entendendo nada, sequer consegui  decifrar o que é cibernética. Sempre há campanhas incentivando a leitura, falando de sua importância para o desenvolvimento do cidadão e eu fico a pensar: por que não dá certo comigo? Sempre lí, desde a infância, mas não consigo  discutir sobre o tema lido, lembrar   o conteúdo, às vezes eu tenho a sensação que  minha leitura é mecânica, que apenas pronuncio palavras, assim como um papagaio, que fala sem saber o que está dizendo. Além de  minha dificuldade de concentração, por três vezes tive que  deixar o texto de lado para  atender o interfone.  Uma grande perda de tempo, sempre a mesma vizinha,  pedindo algum favor e querendo tirar dúvida sobre as face news do whatsApp.
            Para descansar a cabeça, ligo televisão e  sempre as mesma noticias, já repetidas a exaustão, com o intuito de esclarecer a população. A novidade foi que não haverá atividades de  Semana Santa, que até pela internet, estão vendendo álcool gel falsificado, uma receita de fundo de quintal-  gel  para os cabelos, misturados com álcool, o mais barato, com 30 º. -  As pessoas, na ânsia de  levar vantagem em tudo, sequer  prestam atenção  se  há rotulo na embalagem.  A única noticia que valeu a pena foi a que  as redes de farmácia e supermercados venderão álcool gel a preço  de custo. Assim findou o tedioso terceiro dia de cativeiro.

Deixe o seu comentário falando de sua rotina durante  o isolamento.

quinta-feira, 19 de março de 2020

Diário do isolamento Covide 19 - 2º dia

                               
São 21h e 30 min do dia 19 de março de 2020, para os católicos, o dia de São José, mas eu  não fui a missa porque simplesmente não houve celebração, todas as igrejas estão fechadas,  mesmo antes da determinação do prefeito. O dia amanheceu nublado, pela tarde ameaçou chover, ouviu-se até uns trovões distantes, mas a tradicional enchente de São José, fechando o verão não aconteceu, pelo menos, aqui em minha cidade que está muito quente, precisando água  celestial para refrescar, o termômetro está marcando 31º, mas, a sensação térmica está bem acima, a umidade do ar, 79%.
            Hoje levantei com mais disposição, treinei duas páginas de conversação, em meu livro de inglês para viagens, almocei,  lavei  a louça e quando ia descansar um pouco, o interfone tocou, era uma vizinha idosa e promíscua, solicitando  que eu fosse à sua residência ajudá-la com uns telefonemas, o que deixou-me apreensiva porque limpeza, não é o forte dela e nós duas somos pessoas vulneráveis, quanto mais higiene, menos chance de contrair o vírus.  Envelhecer sozinha é muito difícil e não se pode dar ao luxo de negar auxílio, porque  na fragilidade da velhice, um dia você estende a mão e no outro você segura a mão de alguém. Tão logo  desvincilhei – me dela,  higienizei as mão fui ao mercado. O  sol ardia que nem  fogueira de São João Batista e  abri a sombrinha, pelo caminho, encontrei pessoas com máscaras, dentro do mercado também. Comprei o  que precisava e voltei  correndo para casa. Ao guardar as compras, uma grande preocupação: o álcool vendido no mercado é de 30º  e as autoridades orientam  para usar o de 70º, isto é grave, não se encontra o produto eficaz e usei o que consegui para limpar os produtos e fique a divagar sobre as embalagens,  passam por tantas mãos antes de  chegar ao  destino final. Que risco o consumidor está  correndo? Tudo pronto, agradeço a Deus que consegui  vencer  a procrastinação e varri a casa,  mas não tive disposição para passar o pano e limpar os móveis, amanhã farei isto. Depois sai para  caminhar com a vizinha  e fomos extremamente criticadas pelos funcionários do prédio e transeuntes. Duas idosas na rua.
            Ao retornar ao lar, fui  ver as mensagens  do WathsApp e  fique assustada com as medidas tomadas pelos  prefeitos da região, enérgicas, porém necessárias: Shopping,  academias, rodoviárias, e acesso à cidade  controlado. Supermercados e farmácias  abertos, porém, com controle de entrada de clientes entre outras.  A nós, pobre munícipes, cabe cumprí-las ou  uma morte lenta e dolorosa porque o sistema de saúde já está  lotado. Felizmente tenho comida para uma semana, agora é vencer a preguiça, limpar armários, arrumar gavetas, ler bons livros e rezar para acalmar o coração.


quarta-feira, 18 de março de 2020

Diário de meu isolamento domiciliar – Covide 19

                       



            Diário  de meu isolamento domiciliar – Covide 19
            Agora são  18 horas  do dia 18 de março de 2020, final de verão.  O termômetro marca 31º e a umidade relativa de ar, 71%, mas a sensação térmica é bem menos, já que não estou transpirando como um  funcionário da Prefeitura, consertando os intermináveis buracos no asfalto da cidade, e nem como um soldado do Corpo de Bombeiros, apagando  incêndio de grande proporções. Por que decidi  escrever este diário? Para passar o tempo e também, para o caso de um lapso de memória, eu ter a certeza de que a Pandemia do Coronavírus existiu mesmo. Hoje eu tive  ciência da gravidade da situação pela qual o país e o mundo estão passando. Como eu cheguei  a esta conclusão? Não apenas pelo noticiário, mas, principalmente pela experiência   vivida quando eu saí para resolver os problemas característicos de toda dona de casa.
            Ás noves horas, fui ao consultório do meu dentista, e  para minha surpresa, a sala de espera estava vazia e eu fui atendida  no horário marcado. Faz mais de dez anos que sou paciente do Dr Joselito  e sempre suportei em média um atraso de trinta  minutos. Já fique apreensiva!
            Como o Banco fica em  meu trajeto, resolvi aproveitar para  pagar a conta de água e sacar algum dinheiro e fazer a  tão famosa prova de vida, a que todo aposentado é submetido, embora eu ache desnecessário, já que  o caixa eletrônico  é digitalizado e o dedo indicador é fundamental para  que eu possa efetuar qualquer transação,  e surpresa!  Havia apenas eu na agência. Fique bem preocupada!
            Aproveitando que já estava na rua, fui  fazer a renovação do meu cartão de idosa e   encontrei as atendentes em altos papos  porque não havia ninguém na fila,  mesmo assim, decidi ir a Prefeitura  para verificar  uma  pendência  no IPTU de minha residência, lá também, não havia ninguém a minha frente, pude até escolher a recepcionista  para pedir a  informação que  precisava.
            Resolvida às pendências, retornei ao meu lar e ao adentrá-lo, ligo a televisão e as noticias são ainda mais preocupantes, discute-se a possibilidade do Brasil decretar estado de calamidade pública. Não sei o que significa isto, quais as consequências  para as pessoas pobres como eu, mas tenho certeza que é algo muito sério, a situação é de fato muito grave e que eu faço parte das pessoas mais vulneráveis porque já  sou uma idosa e, com  dois agravantes: Sou  sozinha e dependo do SUS para qualquer tratamento. Com  receio de precisar de atendimento público para cuidar de minha saúde em tempos de crise, fui até o Posto de Saúde com o intuito de pedir uma receita de  vitaminas par fortalecer o meu sistema imunológico, mas não fui atendida, sequer pude entrar. A atendente informou que consultas de rotinas estão canceladas, somente estão atendendo  os casos suspeitos de   Covide 19.
            Diante desta triste constatação, decide que dos males, o menor, seguir rigorosamente as orientações do Governo e  que recolher-me voluntariamente ao isolamento domiciliar  é a melhor opção, mas não está sendo fácil. Um desânimo repentino abateu-se sobre mim. Não consegui cuidar dos afazeres domésticos, tentei  falar via whatsApp com  duas amigas  e o papo girou em torno da pandemia     o que deixou-me bem mais deprimida e para completar o quadro, chegou mensagem das instituição  que promovem eventos para a terceira idade, avisando que todas as atividades estão suspensas temporariamente, provavelmente por três meses, até  que se consiga conter o avanço do vírus. Neste período de quarentena, quero reler os livros que estão empoeirando na estante, aprender inglês para viagem, tenho todo o material guardado na  embalagem que chegou  e também, estudar matemática para exercitar o cérebro e, principalmente, vencer esta tristeza, este vazio que   invadiu  o meu coração. Sair? Somente ao supermercado para comprar  alimentos essenciais. Feira livre,  rodízio de pizza, bingo, atividades na igreja, nem pensar, Deus ajuda a quem se ajuda e eu tenho que aceitar a fragilidade  inerente à minha idade. Sou uma idosa, não importa quão jovem seja a minha mente e meus sonhos; o meu corpo  envelheceu e não há nada que  possa mudar isto.

Com está sendo o seu isolamento domicilar?
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segunda-feira, 16 de março de 2020

Inferno astral

                 
            Ouço sempre, mas não sei exatamente do que se trata este tal de “Inferno astral” . Se isto é uma ciência, ou apenas uma invenção popular, para designar o mês anterior ao aniversário natalício, quando  o estado emocional do felizardo não é dos melhores porque, acredito eu, que são oriundos das reflexões  sobre mais um ano  perdido  no quesito sonhos a realizar, oportunidades perdidas, alto custo financeiro das comemorações e demais preocupações inerentes a esta data, porém, o meu caso, neste ano de 2020 foi diferente, coisas terríveis aconteceram, coincidência  ou não, exatamente um mês antes da data exata  em que vim ao mundo pelas mãos   firmes do DR Hélio.           
            Exatamente em 15 de fevereiro, um problema de saúde deixou –me internada cinco dias na área do SUS, em um hospital, sem a presença de familiares  ou amigos para apoiar  naquele  momento difícil que teve continuidade em  casa, após a alta médica. Tão logo tive condições de sair às compras, iniciei a difícil jornada de fazer  supermercado tendo como  meio de transporte uma bicicleta velha. Comprei tudo que o meu dinheiro permitiu para fazer uma pequena comemoração em casa com alguns amigos, gastei mais do que podia, além de estourar o cartão, o corpo também sofreu com o peso das compras e o esforço para pedalar. O momento mais importante o  de enviar o convite, já veio a primeira decepção, das dez pessoas convidadas, apenas uma compareceu, as restantes, desmarcaram  na última hora, para ser exata, 4 horas antes do almço, quanto  a  geladeira e armário já estavam abarrotados de produtos,   a carne assando no forno e a alface toda lava, assim, fez-se necessário  efetuar  chamadas telefônicas logo pela manhã na tentativa de laçar alguém solitário para ajudar a compor a mesa. Optei por  convidar pessoas  que moram sozinhas e  distantes da família e também aqueles   com renda um pouco mais baixa que a minha e que jamais iriam perder a boca-livre e  deu certo, compareceram, cumpriram bem com a função de devorar  grande parte do banquete, evitando que  estragasse na geladeira.
            O fracasso de minha festa de aniversário  não foi apenas no quesito presente, que não ganhei nenhum, e nem tinha como porque foram convidados às 9 horas para um evento que ocorreria às 13 horas, mas  por saber que as pessoas não se importam comigo, que não querem celebrar comigo e não é por medo do Covide  19, porque o número de convidados estava de acordo com as orientações o Poder Publico que orienta eventos com poucas pessoas, assim, não tenho dúvida, o problema sou eu e esta constatação é a minha maior dor, e o pior, é que eu não sei  como tornar-me uma pessoa gostável, gostável e  pelo visto, esse tal de inferno astral perdurou até o meu aniversário natalício mas vou  lutar para fazê-lo desaparecer e dar continuidade à minha vida e buscar novas alegrias em outras querências  do meu amado Rio Grande do Sul.