segunda-feira, 15 de junho de 2020

Diário do isolamento social´90ºdia

                                       Quinze de junho, já estamos exatamente no meio do mês e tantas coisas aconteceram no mundo lá fora e, em minha quarentena,  estou amargando  a dor de ser esquecida por aquele que uma dia, pensei que seria uma companhia agradável até o meu último suspiro. Hoje é o aniversário de  mãe, se ela estivesse viva, estaria completando noventas anos de idade. O seu corpo físico já foi entregue  à terra   e sua alma aos céus faz tanto tempo, mas ela continua viva dentro de mim, ao ponto de eu não ter discernimento de quem eu verdadeiramente sou e o quanto  de minha  aspirações  são os reflexos dos  sonhos  delas, projetados em mim.  
          Durante muitos anos culpei-a pela minha infelicidade, por não ter conseguido realizar nem o que é peculiar a toda a mulher:  a maternidade. Mas o excesso de tempo ocioso e graças  as live que assisti neste isolamento social, eu consegui entender que  a falha sempre esteve mim, em não perceber que cada mãe faz o que pode pelos seus filhos, algumas, a única coisa que conseguem  é dar-lhes  a vida e para isto, fazem um esforço tão grande que acabam morrendo no parto ou entram em depressão profunda após dar a luz e  que as mães, também são seres humanos e oferecem somente aquilo que  elas podem e não o que  os filhos desejam.
            Os sonhos maternos estão arraigados dentro de mim e, ingênua fui eu que não os levei a sério porque ela queria o melhor para mim, para que eu não levasse uma vida  submissa  ao marido, como era antigamente, em que as mulheres dependiam  financeiramente do esposo  para tudo. Ela esperava que  eu estudasse com afinco e aprendesse e executasse bem as atividades a mim atribuídas, que eu soubesse portar-se à mesa,  na igreja, no trabalho, enfim, agisse com educação  em todos os lugares e que a fé, a honra e a solidariedade fizessem parte de minha rotina, infelizmente, eu optei por agir  com rebeldia  e  agressões verbais e uma vez, até física, da qual eu   sinto um profundo arrependimento e vergonha por ter levantado a mão para aquela que me gerou. E ela queria apenas que eu fosse uma mulher independente financeiramente e respeitada.
            Minha mãe fez o pode pelos filhos, e eu, ingrata, optei por frequentar a escola e não aprender nada, não aperfeiçoar - me em algum ofício,  sonhei com um mundo de glamour mas fique parada á espera do milagre que nunca aconteceu. E agora, esperando a lentidão dos dias de isolamento social passar, vejo quanta sabedoria  e bondade havia dentro do coração daquela  mulher analfabeta, que deixou-nos um grande legado  em valores. E eu?  O que deixarei de bom para  aqueles que conviveram comigo  em mais de sete décadas de vida? Lamentavelmente concluo que minha vida sempre foi superficial, com sonhos altos  e atitudes zero e não há ninguém que eu possa culpar  porque  sempre deixei para  amanhã o que deveria ter feito no hoje. Ela mostrou o caminho, mas somente eu podia caminhar.
           

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