Despertei-me com o som do vento do
oeste em minha janela e com ele veio o frio e
uma chuva fina e constante o que fez desaparecer a vontade de sair da cama e iniciar as atividades domésticas,
sempre as mesma limpar a casa e preparar os alimentos, sentar à mesa sozinha e
esperar o lento passar das horas, que nestes dias de confinamento parece
ser mais longas. Não há como negar! Estou triste e solitária a esperar...
Estou sozinha, olhando pela janela a
chuva que cai silenciosamente e que não irá abastecer o lençol freático porque
a capital dos Bandeirantes é uma metrópole
impermeável; a água irá escorrer pelas
ruas até um bueiro e de lá seguirá rumo
aos rios. Frio de inverno em pleno
outono. Entardecer triste e bucólico e não há como afastar da mente os pensamentos da infância
feliz quando as palavras pandemias e isolamento social não eram conhecidas e não
é necessário revolver os neurônios para retornar aos idos tempos e sentir o aroma do café passado em um
coador de pano e do bolo de fubá que acabara de sair do forno. Que saudades do colar da lenha
queimando, no fogão a lenha, que aquecia
toda a cozinha, o lugar preferido da criançada quando a temperatura caia um
pouco. Lá ficávamos brincando até o horário de dormir e a alegria maior era
quando nosso pai chegava do trabalho, faminto, cansado e suado, mas com
disponibilidade para contar como
fora o seu dia e ouvir as reclamações de
nossa mãe, sobre as nossas peraltices.
Observo com alegria a chuva
tamborilando no telhado e escorrendo pela janela e assim vai lavando a poeira decorrente dos meses de estiagem e
faz o trabalho de limpeza para mim. O brilho das folhas das árvores parece
agradecer a água que mata a sede de suas
raízes e parecem felizes a balançar ao sabor do vento que sopra gelado e suave.
Neste silêncio, fico a imaginar que bom
seria se nós tivéssemos a capacidade de ouvir
o som da grama a crescer e das
flores a desabrochar. Vez ou outra, ouço
o pio distante de um pássaro, o miado de um gato solitário que deve
estar distante de casa e sem disposição
para molhar o pelo brilhante. Em meu ângulo de visão, percebo que a
natureza agradece o trabalho das nuvens em
saciar a sede da terra. E eu,
como milhares de brasileiro estou
triste, sem conseguir externar alegria e
gratidão ao céu que faz com que os ciclos das estações acontecem
naturalmente, independente da pandemia.
A tarde se vai e com elas as doces
lembranças de uma época em que vivi no seio de uma família ruidosa. Todos já se foram. A solidão é a
companheira inseparável de quem vive muito e
se não fosse as lembranças do que se viveu, ninguém suportaria o peso
dos anos. As recordações doem no coração,
mas acalentam a alma.
É outono! Mas o outono mais triste
que já vivi porque estou em isolamento social e sem perspectiva de que tudo
volte ao normal antes do inverno que se iniciará em 20 de junho. É assustador
passar o outono inteiro em quarentena! A natureza está se preparando para o repouso
do inverno e os seres humanos na esperança de
andar livremente pela cidade, observar as folhas secas no chão, sentir o
cheiro das árvores e o ritmo alucinante da
maior metrópole da América do Sul e dentro desta aceleração, encontrar subitamente um beija-flor em busca
de uma flor para saciar a sua fome, quiçá também poder apreciar os voos suaves das
borboletas coloridas em contrastes com o cinza
do asfalto. A natureza está fechando
um ciclo para iniciar outro e eu tenho a esperança que este ciclo de
quarentena se feche logo e que nunca mais se repita nesta proporção gigantesca.
A única certeza que temos é que estamos aqui de passagem e devemos fazer
com que esta estadia seja uma experiência bela e valiosa. Aqui chegamos de mãos vazias e assim voltaremos ao pó, de onde viemos. Para a
derradeira morada, levamos apenas as
nossas lembranças e o passaporte de nossas ações, boas e más.
Terça-feira,
02 de junho de 2020
Temperatura-22º
Umidade
relativa do ar:74%
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