segunda-feira, 4 de março de 2019

Bloco do bate volta




          As quatro noites de  carnaval são para divertir, até uma criança de cinco anos sabe disso. A questão é:  o arrimo de família que recebe dois salários mínimos tem condições de  proporcionar esta alegria a sua família? Claro que não! Dizem que cada desejo  vem acompanhado de  coragem para lutar  e nesta  hora, o famoso “ jeitinho brasileiro” entra em ação. Com o firme  propósito de  levar  as crianças para conhecer  o mar e desfrutar deste prazer profano, o patriarca propõe  um plano de ação para  angariar  os recursos  para um “bate e volta” no litoral e os pimpolhos, enfim, poderem brincar gratuitamente nos eventos  organizados pela Prefeitura na areia.
O plano consiste em:
I - Durante um ano, todos deverão guardar no cofrinho as moedas, incluindo as de cinco centavos e  esclarece: “ De grão em grão é que a galinha enche o papo.”
II – Juntar latinhas  de refrigerante e  cerveja para  vender e pondera: “ Não há porque sentir vergonha de   pegá-las em lixeiras e na rua, isto  não é mendigar, é colaborar com a limpeza da cidade. Pobre sim, mas com consciência ambiental.”
III -  Ciente do custo da alimentação e dos gastos  em vestuário, orienta a  patroa das mudanças necessárias para poupar uns trocados para as passagens:
a – roupas, somente poderão ser compradas em brechós ou bazar da pechincha;
b- Carnes serão substituídas por miúdos, são mais baratos e mais nutritivos;
c- Mantimentos e material de higiene e limpeza somente da marca M.B . (mais barato) e guloseimas expressamente proibidas;
d- Remédios, somente os oferecidos  pelo SUS, e distribuídos gratuitamente pelo Posto de Saúde;
e- Durante a missa, nada de colocar moeda na cestinha do ofertório;
f- Para economizar energia, nas estações mais quentes, outono, primavera e verão, banho frio e de cinco minutos. Somente uma lâmpada acessa na casa e  celulares somente poderão ser carregados a cada três dias.
          Ninguém contesta as novas regras da casa porque  todos estão ansiosos pela nova aventura e enfim, chega o grande dia! A  matriarca, com a ajuda da prole numerosa, prepara os lanches que são cuidadosamente armazenado em uma  caixa de isopor, emprestada da vizinha e tarde da noite, recolhe aos seus aposentos. Ninguém consegue dormir,  agitados, rolam na cama para lá e  para cá com medo de perder a hora porque tem que pegar o primeiro ônibus para aproveitar ao máximo o dia. Carnaval na praia, quanta alegria!
          Cinco da manhã já estão todos no ponto de ônibus rumo à rodoviária. Tudo  é diferente e os olhos das crianças parecem pequenos demais para enxergar tantas novidades! Quanto finalmente, desembarcam em seu  destino, mais uma árdua jornada começa, não  há dinheiro para táxi e resolvem fazer o trajeto caminhando. Quando avistam  o mar, o deslumbramento é geral mas não dura nem um minuto sequer, são abordados  por um meliante armado que leva tudo deles, até  as garrafinhas de água das crianças. O dia que era para ser o mais divertido da vida de todos termina com eles na praia, implorando aos banhistas uma moedinha para comprar as passagens de volta e um pão para amenizar a fome que corroía o estômago de todos!

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