Apesar do
susto de ontem, hoje acordei melhor, sem vestígios de febre e com mais disposição para efetuar algumas tarefas
domésticas. Movimentar me faz muito bem. Lavei tapetes, varri e
passei pano com água sanitária, o apto está um primor. Depois que terminei
tudo, a campainha tocou, era o Zelador,
veio entregar o boleto do condomínio e avisar que a reunião para eleição
do novo síndico não foi cancelada,
acontecerá no domingo. Achei um horror! Em
um condomínio onde os proprietários são
majoritariamente idosos, reuni-los
em um pequeno recinto fechado, com pessoas da administrada é, em meu entender, de uma grande
irresponsabilidade. Mas não protestei, estou sem forças para isto, tantos dias
dentro de casa mina as forças de
qualquer cidadã acima dos 60 anos. Findo o trabalho do funcionário, o interfone não
parou de tocar, moradores aflitos com a perspectiva de um aumento do valor do condomínio, nem sei se é pauta Sei que fui irresponsável ao jogar fora, sem ler a
convocação, prestei atenção somente no dia e horário. Fui ingênua, tudo que
acontece no prédio, recai sobre o meu bolso.
O
isolamento social fez-me mais observadora da natureza que está ao alcance de
minha vista, pela pequena janela do meu quarto. Nunca tinha prestado atenção em
quão belo é o céu de abril, um azul único, quebrado aqui e acolá por nuvens
brancas e vez ou outra, cruza a
imensidão pássaros felizes, sem a consciência do que a humanidade está sofrendo, uma pandemia, uma peste que veio para lembrar- nos que somos
seres humanos e que precisamos uns dos outros e, pior, o que acontece a um,
recaí sobre todos. Assim é a lei da natureza, somos todos dependentes uns dos
outros. A quarentena aquieta o corpo e
acelera a mente, o pensamento voa e fica
difícil acompanhá-lo. Penso no pequeno produtor rural, aquele que prepara a
terra, semeia, cuida e colhe o alimento
que nos mantém vivos e de pé. Se o vírus chegar ao campo e dizimar a população rural, tão desprovida
de assistência sanitária e médica o que
será dos citadinos, como eu, que faz mais de 20 anos que não coloco meus pés
sobre a terra , tudo concreto. Precisamos
deles para viver! Antes do confinamento,
nunca tinha refletido seriamente sobre a dependência da cidade do campo, dos
profissionais dos transportes, dos atacadistas, dos profissionais da saúde,
da limpeza urbana, das usinas de energia elétrica, são tantos e tão distantes
de nós, mas precisamos deles para viver.
Que assistência estes profissionais estão
recebendo do governo? Sem eles todos
perecerão de inanição ou peste.
Este
inimigo invisível veio para nos ensinar
humildade, de nada adianta o dinheiro, se
não tem a força de trabalho para produzir, e são as pessoas
simples, muitas vezes, com pouco estudo,
que trabalham muito e recebem pouco, a
força motriz que faz girar a roda do
capitalismo. A estes profissionais essenciais,
o meu sincero agradecimento.
São
18h28min de 24 de dezembro de 2020 Temperatura de 28ª graus, umidade do ar,
57% e eu estou feliz porque estou viva e
assim quero permanecer, sem nenhuma doença, o sacrifício a de
ser válido.
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