segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

Picuinhas passadas

                       Hibernar solitária nas profundezas de uma caverna  já não é mais o sonho de nenhuma pessoa após   nove meses em isolamento social. Voltar á rotina de trabalho e lazer é o sonho acalentado por todos e, retornar as atividades religiosas é um privilégio daqueles que perceberam que com a presença de Deus, todas as provações da vida  tornam-se suportáveis. Tantas atividades que outrora eram cansativas como sair a percorrer shopping da cidade  em busca de  ofertas e lanches altamente calóricos, durante a pandemia são desejos ardentes da criança ao idoso.

          As irritantes picuinhas  dos enamorados de outrora  hoje são doces lembranças, até mesmo aquela  injusta acusação de que a jovem efetuou uma chamada  e quando a cunhada atendeu ao telefone, desligou sem dizer nada. Claro que ela negou veemente, com o argumento de que já havia falado anteriormente com a cunhada  e ela atendeu com educação e boa vontade, e que não havia motivos  para fazer uma falta de educação desta. O confinamento provoca risada naquela moça, que um dia foi acusada injustamente pelo  namorado de estar paquerando o vizinho, na época, ela se alterou e gritou, para todo o quarteirão ouvir; recorda todas as palavras ditas  durante a discussão: -“ Novamente  você está com ideias absurdas sobre mim. Já me confundiu com um pé de chuchu e agora com uma papa Anjo. Tão absurdo o seu comentário que nem consigo ficar com raiva, é simplesmente, hilário! Eu gosto de fazer amizades com os vizinhos, de relacionar-me bem com eles. Entre a política da boa vizinhança e sexo eventual, a distância é bem grande. Em todos os lugares em que morei, mantive bom relacionamento com os vizinhos: amizade, respeito e solidariedade sempre foram o meu  lema. É difícil entender relacionamentos pautados no respeito? O que sexo tem a ver? Você perdeu a noção das coisas?”

          As mulheres maduras  e independentes de hoje, recordam com orgulho de sua força interior, dos preconceitos enfrentados   na luta pelo direito de trabalhar e  morar sozinha. Difícil encontrar uma que  não teve um embate com um namorado por questões familiares, ele, alegando que era homem de forte laços familiares, que  via a família como o alicerce da nação, já ela, era  uma pessoa arredia à família, que é daquelas pessoas que não estão nem aí para   a família de origem vão embora, tentar a vida, sozinha. E ainda tenta passar a imagem que gosta de seu padrasto. Ela se  defendeu: “ Você pensou e analisou friamente e como sempre, concluiu errado. A questão é outra, mas você não admite uma opinião que seja diferente da que você espera ouvir, então, nada direi. Você clama pela verdade das pessoas, mas tem o péssimo hábito de desmerecê-las e já fez isto comigo várias vezes. E tem mais! Estar distante não significa abandono, negação das origens. O amor,  o respeito e a gratidão aos antepassados está dentro da gente. E você acredita se quiser, sou grata ao meu pai pela vida e cuidado, mas agora que ele está no céu, eu  não tenho porque  odiar o meu padrasto, ele não ocupou o lugar do meu genitor, em meu coração, é apenas o homem que minha mãe escolheu para compartilhar as mazelas da velhice.” Outrora, momentos  dolorosos, mas diante do tédio que um isolamento social, as  mágoas passados são  momentos de alegres recordações.

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