sábado, 15 de novembro de 2025

O Silêncio da República

 

Acordei às 4h50, não por insônia, mas pelo canto dos passarinhos — os únicos que ainda parecem lembrar que o dia começou. Enrolei pela casa, saboreando o frescor da madrugada, esse raro alívio que antecede o calor abrasador do sol. Ao deitar,  apesar do calor não  é prudente deixar  uma janela aberta. Há ladrões por toda parte, como sombras à espreita, prontos para tomar o que não lhes pertence com a facilidade de quem já perdeu o medo.

Às seis, varri a calçada. Fiz questão de começar antes que o sol a tocasse, porque ele já não acaricia — ele castiga. Queima como brasa, e às vezes me pergunto se a Terra não é apenas um estágio preparatório para o inferno. O suor escorre, o corpo reclama, mas o espírito... o espírito hoje amanheceu triste.

Era 15 de Novembro. Data da Proclamação da República. Um marco, um rompimento, uma promessa de liberdade e cidadania. Mas na rua, só eu e os passarinhos. Nenhuma bandeira, nenhum hino, nenhuma criança com cartolina colorida. Nenhum sinal de que somos — ou deveríamos ser — uma República.

O poder público silente. A educação, ausente. A mídia, entretida com ofertas de feriado. E o povo? O povo segue o feriado como quem segue um domingo qualquer. Dorme até mais tarde, reclama do calor, compartilha memes. Mas não se pergunta: por que hoje é feriado?

E então me pergunto: qual o sentido de parar a economia, se não há consciência do motivo?

Qual o valor de um dia cívico, se não há civismo?

Uma nação que não celebra sua história está condenada a esquecê-la. E quem esquece o que foi, não sabe o que é — muito menos o que pode ser.

A República, sem memória, vira apenas um nome em papel timbrado. Sem celebração, sem reflexão, sem educação, ela se esvazia. Vira rotina burocrática, vira feriado sem alma. E nesse vazio, cresce o desinteresse, a ignorância, o descaso. Cresce o risco de perdermos o pouco que conquistamos.

Hoje, a rua estava vazia. Mas o silêncio dela gritava. Gritava que estamos falhando. Que estamos deixando de ser República, para sermos apenas um aglomerado de gente que não se reconhece como povo.

Alguém pode me responder: qual o sentido de um feriado cívico, se ninguém se importa com a razão dele existir?

 

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