Acordei às 4h50, não por insônia, mas pelo canto dos passarinhos — os únicos que ainda parecem lembrar que o dia começou. Enrolei pela casa, saboreando o frescor da madrugada, esse raro alívio que antecede o calor abrasador do sol. Ao deitar, apesar do calor não é prudente deixar uma janela aberta. Há ladrões por toda parte, como sombras à espreita, prontos para tomar o que não lhes pertence com a facilidade de quem já perdeu o medo.
Às seis, varri a calçada. Fiz questão de começar
antes que o sol a tocasse, porque ele já não acaricia — ele castiga. Queima
como brasa, e às vezes me pergunto se a Terra não é apenas um estágio
preparatório para o inferno. O suor escorre, o corpo reclama, mas o espírito...
o espírito hoje amanheceu triste.
Era 15 de Novembro. Data da Proclamação da República.
Um marco, um rompimento, uma promessa de liberdade e cidadania. Mas na rua, só
eu e os passarinhos. Nenhuma bandeira, nenhum hino, nenhuma criança com
cartolina colorida. Nenhum sinal de que somos — ou deveríamos ser — uma
República.
O poder público silente. A educação, ausente. A
mídia, entretida com ofertas de feriado. E o povo? O povo segue o feriado como
quem segue um domingo qualquer. Dorme até mais tarde, reclama do calor,
compartilha memes. Mas não se pergunta: por que hoje é feriado?
E então me pergunto: qual o sentido de parar a
economia, se não há consciência do motivo?
Qual o valor de um dia cívico, se não há civismo?
Uma nação que não celebra sua história está
condenada a esquecê-la. E quem esquece o que foi, não sabe o que é — muito menos
o que pode ser.
A República, sem memória, vira apenas um nome em
papel timbrado. Sem celebração, sem reflexão, sem educação, ela se esvazia.
Vira rotina burocrática, vira feriado sem alma. E nesse vazio, cresce o
desinteresse, a ignorância, o descaso. Cresce o risco de perdermos o pouco que
conquistamos.
Hoje, a rua estava vazia. Mas o silêncio dela
gritava. Gritava que estamos falhando. Que estamos deixando de ser República,
para sermos apenas um aglomerado de gente que não se reconhece como povo.
Alguém pode me responder: qual o sentido de um
feriado cívico, se ninguém se importa com a razão dele existir?
Nenhum comentário:
Postar um comentário