Hoje, ao deslizar os olhos pelas redes sociais, tropecei numa foto da Praia Grande. A cidade do litoral sul paulista, plana como um suspiro, com a Serra do Mar ao fundo, verde e azul em eterna harmonia. E ali, entre pixels e lembranças, fui tragado por uma saudade que não era só da paisagem — era daquilo que nunca vivi de verdade.
Lembrei dos ventos fortes que varriam as calçadas,
da serração que escondia o horizonte, do cheiro salgado que grudava na pele e
do som do mar que embalava os dias. Lembrei do comércio farto, das feiras
livres, dos peixes com gosto de oceano. Alguns eu até comprava, mas mais com os
olhos do que com a boca. Aposentado, o apetite é mais sonho do que realidade.
Nunca há dinheiro suficiente para saborear as iguarias que a cidade oferece. E
mesmo assim, havia a ilusão — doce e cruel — de que morar na praia era sinônimo
de felicidade. Era poder. Era liberdade.
Mas que liberdade é essa que não permite desfrutar
da própria rua? Dos quiosques belíssimos que só se admira de longe, como quem olha
vitrines de um mundo que não lhe pertence? Das atividades culturais que se
escondem nos cantos periféricos, oferecidas por centros de convivência e
igrejas que cobram pouco, mas ainda assim cobram? Ter e não poder. Viver e não
sentir. Praia Grande me deu guarida por cinco anos, mas nunca me deu
pertencimento.
Reconheço: a cidade oferece muito. Mas há algo
maior que vive dentro de mim — e que nenhuma vista para o mar consegue calar. A
solidão. A ausência de alguém em quem confiar. A falta de importância. Nunca
fui importante, nem para os meus pais. Às vezes penso que, se tivesse morrido
na infância, teria sido apenas uma boca a menos para alimentar. Fiz terapia,
mudei de cidade, tentei construir laços, formar uma família, ser alguém que
fizesse falta. Mas se eu morresse agora, neste exato momento, talvez ninguém
notasse.
A solidão, essa amiga do peito, me acompanhou por
tantas andanças que acabei voltando à terra natal. E lá, descobri que o
esquecimento já havia feito morada. Não faço falta. Não sou lembrança. Sou
silêncio.
Por isso, ao ver aquela foto da Praia Grande, senti
saudade da geografia — da planície, da serra, do mar. Mas não das pessoas.
Porque viver sem conviver é uma sina triste. E há paisagens que, por mais belas
que sejam, não conseguem preencher o vazio de não ser esperado por ninguém.
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