Há dias em que a alma parece inquieta, como se tivesse perdido o compasso com o corpo. Uma fome que não é de comida, mas que se disfarça em carboidratos — pão, bolo, biscoito, qualquer coisa que traga a ilusão de acolhimento. Vinte e quatro horas por dia, o apetite não dá trégua. Tentei ginástica, caminhada, até respiração consciente. Melhorou, mas não resolveu.
Foi então que, num gesto de coragem silenciosa,
decidi confiar no invisível. Comprei um floral de Bach por quarenta reais,
desses de pronta entrega, com o rótulo que prometia alívio para “preocupações e
sofrimentos diários”. E não é que funcionou? A compulsão por roer unhas —
aquela mania de coelha urbana, sempre mastigando alguma quitanda — começou a se
dissolver.
Mas o que me surpreendeu mesmo foi o sonho. No
terceiro dia, ele veio como um filme em alta definição. Sonhei com uma ferida
na perna, parecida com uma espinha inflamada, cheia de pus. Resolvi aplicar
água oxigenada, dessas farmacêuticas. Quando começou a borbulhar, saltaram dali
uns bichinhos finos, como minhocas em miniatura, e foram direto ao chão. Um
salto digno de fazer inveja às pulgas. Tentaram voltar à ferida, mas não
conseguiram. Acordei com a sensação vívida, olhei a perna, nada. Só o sonho.
Corri para a internet, porque comentar com os próximos
— que seguem o espiritismo — seria ouvir que eram espíritos saindo do corpo.
Como aquele vidro do basculante que quebrou com o vento. Estava lá há mais de
dez anos, sem manutenção. Normal, eu diria.
Mas o sonho, do ponto de vista holístico, revelou-se
um símbolo poderoso. A ferida era um portal. Os bichinhos, resíduos emocionais,
padrões antigos, talvez até crenças que já não me servem. O salto deles foi a
libertação. A tentativa de retorno, a prova de que não há volta quando se
escolhe curar. O corpo fala, mas o inconsciente grita — e às vezes, sonha.
Desde então, estou mais leve. Continuarei com os
florais de Bach. Eles cabem no meu orçamento e, mais importante, cabem na minha
fé. Todo mês, um novo frasco para combater os pensamentos ruminantes, a compulsão
por carboidratos e o bruxismo noturno. E nem me fale em nutricionista — já fui,
e é como jogar dinheiro fora. Dietas que ignoram a alma e o bolso.
Estou confiando no floral. Porque às vezes, o que
cura não é o que se vê, mas o que se sonha.
Nenhum comentário:
Postar um comentário