Eis que surge do cenário opaco da existência a figura de Caetana, alma
extenuada pelos anos e assolada pelo peso de um sentimento insidioso—um veneno
destilado em doses contínuas desde os tempos de menina. A inveja, este monstro
sorrateiro, fez-se seu fiel escudeiro, guiando-lhe os passos ao longo da
estrada tortuosa de sua vida.
No seio de um lar onde a tecnologia era luxo de gente abastada, Caetana
labutava desde as primeiras luzes da aurora, empunhando vassouras e panelas,
enquanto sua irmã adotiva repousava em lençóis macios, envolta pela afeição
materna e pela deferência dos que a cercavam. Ah, os olhos de sua mãe! Para
aquela outra, eram janelas de ternura e orgulho; para Caetana, apenas farpas de
crítica e desdém.
— O destino, sempre cruel, faz do injusto sua lei — murmurava ela, entre
suspiros de resignação e revolta.
Passaram-se os anos, e a lista das admirações travestidas de rancor só
crescia. A inteligência da irmã, sua fluidez verbal, o magnetismo com os
rapazes, a destreza em transitar pelo mundo sem tropeçar em obstáculos—tudo era
espetáculo que Caetana assistia da última fila, amarga espectadora de sua
própria insignificância.
Mas o grande júbilo veio quando a roda do destino girou e finalmente lançou
sua rival na ruína! Desgraça financeira e conjugal, um golpe de mestre do
universo! E, qual cordeiro vestido em pele de caridade, Caetana estendeu-lhe a
mão. Não por amor, que sentimento tão nobre não lhe cabia, mas por uma cruel
satisfação. A humilhação alheia era seu triunfo secreto.
Por dez anos sustentou a irmã e sua prole, não como ato de bondade, mas como
um tributo ao espetáculo da desgraça. Cada moeda dada era uma pedra no trono da
sua vaidade, cada favor concedido, um selo de sua falsa magnanimidade. Mas eis
que a rival, sempre ardilosa, reergueu-se! Com astúcia e estratégia, livrou-se
das correntes da dependência e triunfou novamente.
E o que restou a Caetana? O espetáculo de sua própria decadência. A irmã
deleita-se com vinhos finos em Lisboa, enquanto ela sorve tragos mornos da
cerveja guardada na isopor. A irmã veste-se em elegância europeia, enquanto ela
se debate entre as pechinchas do Brás. Enquanto uma percorre hipermercados em
carros reluzentes, a outra arrasta seu carrinho de feira.
E agora, a solidão lhe bate à porta com o rigor de uma sentença irrevogável.
O doce sabor da vingança revelou-se veneno, a satisfação, um engano. E então,
na triste epifania de seus setenta anos, Caetana compreende: não foi o destino,
nem a sorte, nem os caprichos dos homens que lhe impuseram tal ruína. Foi a
inveja—sempre ela—que lhe roubou os anos e lhe negou o que mais desejava.
Mas agora já era tarde, e a única resposta que o mundo lhe oferece é o eco
de sua própria escolha.
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