quinta-feira, 6 de agosto de 2020

Diário da quarentena - 142º dia

                       Gosto de  acordar cedo pelo prazer de  ver  a escuridão se dissipando aos poucos e as flechas dos raios de sol  a descortinar  novas nuances de cores nos telhados das casas, nas folhas das árvores e na alma dos que cedo despertam para saudar o astro rei e  iniciar a labuta diária pelo pão de cada dia. Eu preciso aproveitar este sol porque  em agosto chove em média uns 10 dias  e eu preciso da energia solar para dissipar esta tristeza  ocasionada pelo distanciamento social. Sinto falta até das conversas com estranhos em pontos de ônibus. Sou latina americana, afetuosa por natureza e preciso do contato  físico, mas estamos em quarentena, pertenço ao grupo de risco e devo proteger-me. Não acredito mais que tudo isso vai  passar, apenas pelo ciclo natural do vírus,  mas  quero  acreditar que a vacina  em breve estará disponível para a população e  eu serei a primeira da fila para recebê-la e ficar livre da Covid-19 e quando isto acontecer, quero passar uma temporada no litoral sul de São Paulo e apreciar as manhãs de sol claro e ondas quebrando  na areia e  sentir-se sólida e sadia  diante da imensidão do mar azul e sem medo do coronavírus e para este momento  tão esperado, vou comprar um novo maiô, sair de uma  quarentena simboliza um novo renascimento para a vida.

            Fazendo uma retrospectiva destes  141 dias de quarentena, percebo como aos pouco a minha vaidade foi minada. Fico de pijama até o horário do almoço, sequer penteio os cabelos  grisalhos, que já estão clamando por tinta, a faixa branca deixou-me com uma aparência de  uns noventas e cinco anos. Os perfumes, batons e brincos foram esquecidos na penteadeira. Desleixada: isto, tornei-me  uma idosa  sem vaidade, sempre  assustada, com medo dos perigos visíveis e invisíveis. Agarro-me a esperança que  tudo isso vai passar e em breve, em uma manhã ensolarada, estarei caminhando displicentemente em uma praia de espumas brilhantes sentindo  a brisa marítima  a  lavar  os meus pulmões das fuligens acumuladas no período de confinamento e  levando as últimas lembranças  destes dias tristes, com os olhos e ouvidos atentos aos noticiários  que  mais amedrontam do que  informavam. Este vai chegar, tenho fé!

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