quinta-feira, 30 de outubro de 2025

O Grande Teatro das Panelinhas

 


Na última edição da Conferência Municipal da Cultura, o palco estava montado, os holofotes acesos e os papéis bem distribuídos. Pena que o espetáculo não era sobre cultura, mas sobre como manter o sistema público em sua eterna dança das cadeiras — onde os convidados são escolhidos a dedo, os convites são sussurrados entre os iniciados, e o povo, esse detalhe inconveniente, é mantido à margem, como figurante sem fala.

A plateia? Funcionários municipais devidamente escalados para garantir que houvesse público. Afinal, não se pode realizar um evento vazio — seria um vexame para a encenação. Já os líderes religiosos, que poderiam contribuir com a vocação natural da cidade para o turismo espiritual, foram ignorados com a elegância de quem finge que não ouviu. Talvez porque fé não se encaixe bem no roteiro das panelinhas.

Durante os grupos de trabalho, surgiu a queixa clássica: “A população não reconhece o patrimônio material e imaterial da cidade.” Eis que uma alma ousada — eu — propôs algo concreto: um projeto de educação patrimonial com escolas, ônibus, guia, caderno de atividades, passeio pelos bairros, explicações sobre arquitetura e história das ruas. Uma ideia com começo, meio e fim. Um crime imperdoável.

A relatora, fiel ao script do teatro burocrático, ignorou solenemente a proposta. Preferiu registrar sugestões que não ameaçassem o status quo, como levar idosos às escolas para falar sobre seus saberes. Uma proposta que, embora poética, já se provou um fiasco: os idosos têm conhecimento, sim, mas não têm a didática para lidar com estudantes inquietos e professores que aproveitam o momento para corrigir provas e olhar para o além.

A conferência terminou como começou: com pompa, protocolo e uma sensação de que tudo foi feito para parecer que algo foi feito. A cultura, essa entidade abstrata, segue sendo usada como cortina de fumaça para encobrir a falta de ação concreta. E as panelinhas? Bem, essas continuam fervendo, temperadas com indiferença e servidas em pratos de porcelana institucional.

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