terça-feira, 27 de agosto de 2024

O Mistério dos Ipês e a Dança das Nuvens

 

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·         Era uma vez, em um rincão esquecido do cerrado, onde o sol se derramava generoso sobre a terra ressequida, que viviam dois velhos amigos: o Ipê Amarelo e a Caliandra. Suas raízes entrelaçadas contavam histórias antigas, segredos sussurrados pelo vento e promessas de chuva.

·         Os mais velhos da região diziam que a natureza tinha seus próprios sinais. Quando as formigas marchavam em fila indiana, carregando folhas maiores que elas mesmas, era sinal de que a chuva estava a caminho. As vacas, normalmente preguiçosas sob o sol escaldante, ficavam inquietas, olhando para o horizonte como se esperassem algo. E os pássaros, esses alados mensageiros, voavam mais baixo, como se quisessem tocar a terra antes que as primeiras gotas caíssem.

·         Mas o verdadeiro espetáculo acontecia quando o Ipê Amarelo e a Caliandra decidiam florescer juntos. Suas copas se enchiam de cores vibrantes: o amarelo do Ipê e o vermelho intenso da Caliandra. Diziam que, quando isso acontecia, era sinal certo de chuva. Os velhos apontavam para o céu e murmuravam: “Olhem, as árvores estão celebrando. A chuva está próxima.”

·         E havia outros indícios. Quando as aranhas teciam suas teias em cantos estratégicos, era porque a chuva ainda estava distante. Elas eram as sentinelas, fiandeiras de destino, e sabiam quando era hora de preparar seus laços para capturar as gotas que cairiam do céu.

·         Os sapos, esses pequenos filósofos do brejo, também tinham seus segredos. Em dias de baixa umidade, eles permaneciam mergulhados na água, olhos semicerrados, esperando. Mas quando a chuva se aproximava e a umidade do ar aumentava, eles emergiam, saltando de folha em folha, coaxando com alegria. Era como se soubessem que a vida renascia com a água.

·         E então, os olhos se voltavam para o céu. As nuvens, essas viajantes errantes, traziam consigo mensagens codificadas. As pretas anunciavam tempestades sem ventos fortes, como se o próprio ar segurasse o fôlego. As marrons, essas eram as tempestades com ventos furiosos, capazes de arrancar telhados e desafiar a coragem dos homens.

·         As brancas, ah, essas eram traiçoeiras. Pareciam calmas, mas escondiam segredos. Quando o céu se tingia de branco, os mais experientes sabiam que era hora de se abrigar, pois a tempestade viria sorrateira, sem alarde.

·         E as cinzas? Essas eram as chuvas leves, as que lavavam a poeira das folhas e traziam alívio à terra sedenta. Mas quando o céu se vestia de cinza, era porque a tempestade abraçaria toda a região, demorando-se como um velho amigo que não quer partir.

·         Assim, entre Ipês e Caliandras, aranhas e sapos, nuvens e ventos, o cerrado dançava sua dança ancestral. E os velhos, com olhos enrugados e corações sábios, observavam o espetáculo, sabendo que a chuva era a promessa da vida renovada.

·         E assim, sob o céu amplo do cerrado, o mistério dos Ipês e a dança das nuvens continuam, entrelaçando passado e presente, esperança e saudade, como um poema escrito pelas mãos invisíveis da natureza.

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