Por que sou profundamente grata ao ano
de 2019, apesar de todos os atropelos na política e das sangrentas manchetes de jornais? Porque
após 50 décadas de angústias, enfim, eu tive um ano sereno. Não quero
dizer com isto que foi um ano de dinheiro jorrando da conta, festas e mais festas, paixões
arrebatadoras e amores ardentes. Nada disto! 2019 foi um ano
em que eu descobri a minha
verdadeira essência, quem realmente eu sou, não a pessoa que a minha mãe queria que eu fosse. E esta descoberta aconteceu naturalmente. Com
uma parca aposentadoria, mudei-me para uma cidade praiana, conheci pessoas
humildes e descobri o prazer das coisas simples, como caminhar no
calçadão ao entardecer, sentar na areia
apreciando o azul do mar e ouvindo o marulhar das ondas. Outra descoberta, na
qual aprendi o verdadeiro sentido do viver, foi a convivência nos grupos de terceira idade. Estar
juntos, sem competição, pautada na
solidariedade, permitiu que a minha verdadeira identidade, que fora
sufocada pela pressão materna, induzindo-me
a perseguir uma vida de glamour,
em outras querências, florescesse e posso dizer, com segurança, que teria sido
bem mais feliz, se não tivesse deixado
minha terra natal em busca de um sonho, que não era meu. Eu teria sido bem mais
feliz, em um bairro periférico, cuidando da casa, dos filhos, marido e
tomando a fresca, nas noites quentes,
conversando com os vizinhos, visitando os parentes aos domingos, recebendo-os
em casa, participando das festas
tradicionais da cidade,enfim, uma vida normal.
Mas o que foi a minha vida? Foi uma
perseguição árdua de uma verdade que não era minha! Sempre na periferia,
sonhando em morar e conviver com pessoas dos bairros nobres, mas a intransponível
barreira do dinheiro, sempre impediu-me
de estar, onde eu imaginava que gostaria
de estar. Questiono-me sempre, sobre a minha força de vontade, que não fui
capaz de lutar o suficiente,
procrastinei muito, não aperfeiçoei-me em nada, não domino nenhum assunto,
gastei tempo e dinheiro em congressos, seminários, palestras e exposições artísticas, e nunca consegui
entender a razão dos eventos, impossibilitada de conversar a respeito por não
ter base cultural e discernimento do assunto em questão.Queria apenas parecer
chic! Deve ser isto? A infelicidade e a incompetência, também foram minhas
companheiras durante minha vida
profissional. Por que afirmo categoricamente o meu fracasso profissional?
Durante os 30 anos de trabalho, nunca consegui uma promoção, apesar dos
esforços, nunca vi a minha foto no painel do funcionário do mês, nunca recebi um convite profissional. Vários colegas
saíam das empresas, já para outra, a convite. Eu sempre bate à porta do patrão,
enfrentei filas, fiz testes, participei de dinâmicas, e sempre conseguia estar o chão da fábrica. Admito,
não fui, não sou e acredito não ser jamais, uma boa profissional. Eu teria sido
boa esposa, boa mãe, boa nora, porém, não consegui discernir o meu eu verdadeiro, uma pessoa que queria apenas ser amada e persegui um sonho que não meu, o sonho do luxo, status social. Não consegui realizar nenhum dos dois, vivi décadas
de angústias e privações, para finalmente, com a aposentadoria, encontrar a
serenidade em uma vida simples, com
apenas um desejo a realizar. Viver um relacionamento sério, pautado no respeito
e companheirismo. Obrigada ao ano do
porco!
Rosalina,
31 de dezembro de 2019
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