Não dá para acreditar. Passei semanas economizando, juntando moedas e cortando pequenos luxos, só para comprar um bolo de fubá para minha irmã. Nada extravagante, apenas um gesto simples para marcar seus 66 anos de vida. Vinte reais foi o que consegui gastar, o bastante para trazer um pouco de doçura ao dia dela.
Quando lhe entreguei o bolo, com um sorriso tímido, murmurei: "Sessenta e seis anos merecem um bolinho."
Ela olhou o bolo com um olhar vazio, quase de desprezo, e sem emoção disse apenas:
— Coloca lá na pia.
E virou-se, como se meu gesto fosse nada mais do que um incômodo qualquer. Não provou do bolo, não comentou, não sorriu. Apenas o bolo, esquecido na pia, enquanto eu segurava o peso de uma mágoa que crescia no peito.
Fiquei ali, imóvel, sentindo o bolo esfriar junto com meu ânimo. O cheiro doce de fubá parecia agora amargar no ar. Não era pelo bolo, claro, mas pela ausência de reconhecimento. Pela indiferença que doeu mais do que qualquer palavra ríspida.
Talvez o que mais magoa não seja a desfeita em si, mas perceber que gestos simples, vindos do coração, podem ser descartados tão facilmente. E ali, diante da pia, compreendi que nem todo carinho encontra abrigo.
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