O
crepúsculo de 2024 despedia-se com um brilho melancólico. No horizonte, os
últimos raios do sol tingiam o céu com matizes de ouro e rubi, refletindo-se
nas lágrimas silenciosas que Maria derramava diante do altar em seu quarto.
Ali, entre flores de papel desgastadas e velas semi-derretidas, repousavam
imagens de Santa Terezinha das Rosas, Santo Expedito, São Longuinho, Nossa
Senhora Desatadora de Nós e São Bento. Seus olhos buscavam no vazio o alívio de
uma esperança às vezes tão distante quanto as estrelas que começavam a
pontilhar o firmamento.
Foi um
ano marcado pela perda e pela luta. A morte de familiares arrancara de Maria
não apenas as presenças amadas, mas também a certeza de um futuro em que o
legado da família seria uma ponte para dias menos sombrios. O espírito da
justiça, tão frequentemente evocado, parecia brincar com ela, escondendo-se em
meandros burocráticos e na lentidão do sistema, como se as engrenagens da lei
estivessem lubrificadas com areia ao invés de óleo.
Os erros
do passado, fruto de negligência administrativa nos negócios familiares,
pareciam vultos a rondar sua mente. Cada dia era uma batalha contra o peso da
memória e a dureza do presente. As novenas se sucediam como as batidas de um
coração esperançoso, mas exaurido. Cada oração era uma rosa oferecida aos
santos, uma promessa de que ela persistiria, mesmo quando a fadiga tornava o ar
denso e os pensamentos nebulosos.
Maria
acreditava na intercessão divina. As imagens dos santos não eram apenas
esculturas de gesso ou pinturas desbotadas; eram âncoras para sua alma
flutuante, janelas para um reino onde a justiça não era apenas uma palavra, mas
um ato. E, apesar de sua fé, algo em seu coração dizia que 2024 precisava ser o
fim daquela jornada de pedidos e novenas. Os santos haviam ouvido. Eles
atendiam na linguagem dos sinais: um vento que balançava as cortinas em meio ao
silêncio da noite, um perfume inexplicável de rosas que atravessava o ar, ou o
simples alívio em uma noite de sono profundo.
Enquanto
a lua subia no céu, Maria fez uma última oração. Desta vez, suas palavras não
eram de súmula, mas de gratidão. A esperança pulsava em seu peito com a
intensidade de um fogo renovado. 2025 seria diferente. Ela visualizava, com os
olhos fechados, o momento em que o legado de seus pais, finalmente liberto das
amarras da burocracia, lhe permitiria abandonar a vida de economia e miséria. O
futuro prometia ser um jardim de abundância, onde ela poderia colher os frutos
de tantos anos de lágrimas e orações.
Maria se
deitou, e em seus sonhos, caminhou por um campo repleto de rosas. Cada flor
representava um pedido, uma prece, uma espera. No centro do campo, uma luz
suave emanava de uma árvore frondosa, sob a qual estavam sentados seus pais,
sorrindo. Ao se aproximar, sentiu uma paz indescritível. Entendeu que o tempo
não era um inimigo, mas um escultor, moldando com paciência os contornos de uma
vida mais justa.
Quando a
alvorada de 2025 chegou, Maria acordou com um sorriso. O jardim das promessas
estava mais perto do que jamais estivera. Agora, era apenas questão de colher
as rosas.
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