quinta-feira, 14 de novembro de 2024

Encontros com o Irônico Oráculo da Natureza

 

Não sei o que tem se passado comigo ultimamente. Talvez a amarga decepção com a humanidade tenha lentamente deslocado meu olhar para o reino da natureza, como quem, ao perder a fé nos homens, tenta buscá-la nas plantas e nos bichos. Mas que não se confunda minha inclinação: não tenho o menor apreço por esse costume antiquado de sequestrar uma criatura do seu habitat, arrancá-la de seus iguais e trancá-la em uma casa, adornada com travesseiros e coleiras, sob a desculpa de um “bem-estar” inventado. Como se a felicidade do animal estivesse em perder sua liberdade para a estimação de algum humano bem-intencionado.

Em menos de um mês, fui agraciado com encontros, digamos, insólitos. Primeiramente, duas serpentes deslizaram pelo meu caminho. Uns diriam que trazem maus presságios, outros juram que é sinal de renovação e transformação – afinal, elas têm a exótica habilidade de largar suas peles, como se a cada ciclo tivessem o luxo de deixar para trás o passado indesejado. Em seguida, deparei-me com um besouro de antenas descomunais. Se o velho Egito conferia ao escaravelho o título de amuleto da sorte, talvez devesse então aguardar meus dias de glória.

Mas não acabou por aí. Um estranho ser rastejante me desafiou a lógica: grande demais para ser minhoca, pequeno demais para ser cobra. Talvez uma piada interna do universo para testar minha paciência. E para encerrar com um toque de teatro natural, dei de cara com uma seriema, que abriu o bico com entusiasmo no exato instante em que passamos um pelo outro. O que dizer? Senti-me lisonjeado, como se o próprio cosmos tivesse feito um breve espetáculo para mim. Que sejam bons augúrios, pois preciso crer que, ao menos, a natureza ainda reserva alguma poesia para o meu desassossego.

 

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