Rosália, com seus sessenta anos, encontrou-se presa entre o aço retorcido de um acidente de carro. A bacia quebrada, o fêmur deslocado — sua vida, outrora cheia de movimento, agora reduzida a uma imobilidade dolorosa. O cirurgião ortopedista traumotologista, com olhos sérios e palavras gentis, prescreveu meses de repouso absoluto. E assim, Rosália se viu confinada à cama, com a cadeira de rodas como sua fiel companheira.
Os filhos mais velhos,
preocupados e pragmáticos, sugeriram uma casa de repouso. Mas Rosália, teimosa
e resiliente, recusou. Ela preferia a companhia de seu filho de dezoito anos e
de sua nora de dezesseis. Juntos, eles se tornaram seus guardiões, seus anjos
improvisados. Eles aprenderam a arte de cuidar, trocando fraldas, ajustando
travesseiros e sorrindo mesmo quando o cansaço os abraçava.
Um mês se passou desde a alta
hospitalar, e Rosália retornou àquele lugar de corredores brancos e cheiro de
desinfetante. Uma embolia pulmonar, traiçoeira como uma sombra, a atingiu.
Agora, sua situação era gravíssima. Seu filho mais velho, com o coração
apertado, teve que partir. A licença médica expirou, e ele voltou ao seu estado
de origem, deixando Rosália aos cuidados do tempo e da inexperiência.
Ele não compreendia que já havia
feito tudo o que podia. Alugou uma casa próxima ao hospital, instalou cercas
elétricas para segurança, adaptou o banheiro para acessibilidade e comprou cadeira de rodas e banho. Sua tia, uma voz
sensata no turbilhão de emoções, acionou a assistente social. Orientações foram
dadas, limites estabelecidos. O caçula, com o sumário de alta nas mãos, bateu à
porta do posto de saúde, implorando por visitas domiciliares.
A tia acreditava que todos haviam
feito o que estava ao alcance. Agora, era hora de silenciar e permitir que o
caçula se transformasse. Ele, que vivia da pensão do pai, sem trabalho ou
estudos, carregava o peso da responsabilidade. Cresceria pela dor, se não pelo
amor. As escolhas feitas em nome da vítima, Rosália, revelariam seus benefícios
ou consequências com o passar do tempo. Talvez todos amadurecessem, ou talvez a
negligência deixasse marcas indeléveis.
E assim, no silêncio das rodas
que deslizavam pelo chão, Rosália aguardava. Fisioterapia pulmonar e
ortopédica, medicação pontual, avaliações médicas regulares — tudo isso se
tornou seu novo mundo. Seu filho, agora distante, aprendia a ser homem, não
apenas pelo amor, mas também pela dor. E no coração de todos, a esperança e o
temor dançavam uma valsa incerta, enquanto o tempo seguia seu curso implacável.
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