As mudanças que a vida impõe são como ventos inesperados, capazes de transformar paisagens inteiras. Um ano atrás, Clara vivia de maneira leve, quase etérea, deslizando pela existência sem grandes preocupações. Quando navegava na internet, era sempre em busca de eventos gratuitos, de encontros casuais que preenchessem suas horas vazias. Construía amizades frágeis, sustentadas apenas pelo desejo mútuo de fugir da solidão.
— Mas você é feliz? — perguntavam-lhe às vezes.
E ela hesitava antes de responder. Felicidade era um conceito escorregadio. Poderia dizer que sua vida era descomplicada, livre das amarras das responsabilidades familiares. Talvez isso bastasse.
Porém, o destino, com suas reviravoltas impiedosas, a trouxe de volta à cidade natal. O retorno não veio sozinho: trouxe consigo a dor, a responsabilidade, a angústia. O irmão, antes tão cheio de vida, jazia agora entre lençóis de hospital, vítima de um acidente de trânsito. O futuro dele se tornou uma incógnita cruel.
— Vou voltar a andar, não vou? — perguntou ele, certa noite, a voz carregada de medo.
Clara engoliu em seco, sentindo o peso de todas as incertezas do mundo. Como poderia responder?
— Claro que sim… — sussurrou, mas a própria voz soou hesitante, traindo a esperança que tentava transmitir.
Se antes deslizava pelas redes sociais em busca de diversão, agora sua navegação se restringia a pesquisas sobre produtos ortopédicos, tratamentos, alternativas. Suas saídas eram para hospitais, para resolver pendências familiares, para despedir-se de conhecidos que partiam.
— E você? Está feliz? — insistiu um velho amigo, ao encontrá-la depois de tanto tempo.
Clara desviou o olhar. Como poderia dizer que, mesmo servindo ao próximo, um vazio persistia dentro dela? Nunca encontrara alguém com quem pudesse compartilhar suas inquietações mais profundas. Sentia, dia após dia, que se doava mais do que recebia, que valorizava os outros mais do que era valorizada.
O irmão segurou sua mão com força inesperada.
— Obrigado por estar aqui — murmurou.
E naquele instante, Clara percebeu: talvez sua dor não fosse tão solitária. Talvez, na partilha do sofrimento, houvesse um eco de pertencimento. Mas felicidade? Não, essa ainda lhe escapava como um vento distante.