Nilza
é contemporânea das feministas da década de1960 e, a exemplo das
revolucionárias, abdicou da tradição familiar para alçar voos em
outros ares, que naquela época, acreditava-se ser o melhor para a mulher
moderna e independente financeiramente. Ao completar 18 anos providenciou seus
documentos, procurou trabalho, economizou e partiu de sua pacata cidade rumo à
capital, na expectativa de uma vida divertida freqüentando
lugares elegantes com os amigos. Viagens ao exterior e renovação anual do guarda-roupa com os últimos lançamentos da
moda parisiense faziam parte da bagagem. Quanta ilusão!
Sem indicação e qualificação,
levou mais de um ano para conseguir um trabalho. Recebia um salário mínimo que
mal dava para o transporte, alimentação básica e moradia em uma casa de família
em que alugou um quarto coletivo. As colegas de quarto, como ela, iludidas com a emancipação da mulher, não conseguiam enxergar que sonhar é bom, porém, qualificação
profissional, esforço, persistência e um pouco de sorte são necessários para
alcançar os objetivos e assim iam vivendo os seus dias contando com a
possibilidade de um milagre e enquanto ele não acontecia, percorriam lojas de
ruas populares, promoções e pontas de
estoque para manter um visual apresentável
e uma fome crônica, já que os minguados
recursos mal davam para comprar os produtos da cesta básica nas promoções dos
mercados próximos à residência ou trabalho, para economizar o dinheiro da
condução e assim, no domingo, comprar algumas verduras na xepa da feira livre.
Nos vinte anos em que viveu no interior, Nilza queixava-se
das poucas oportunidades de lazer que a cidade oferecia: missa diária, festas do calendário
católico: solenidades da semana santa, pentecostes, dia de finado, natal. Alguns casamentos e
batizados, festa do padroeiro da cidade, aniversário da cidade e barzinhos e
restaurantes, e aos sócios do clube, as atividades exclusivas para os freqüentadores. Para ela
era pouco, queria mais. O sonho de desfrutar da
riqueza cultura da capital foi
por terra com a velocidade de um
tornado. Trabalhava muito, ganhava pouco
e estava sempre cansada e sem dinheiro, nem
das atividades religiosas participava mais porque mesmo sendo abertas à comunidade, não dispunha de tempo e do
dinheiro para a condução. Em meio a desilusão e carestia, passaram-se
trinta anos e ela deixou a dura vida de
trabalhadora e pode enfim, gozar o privilégio da aposentadoria e, ingenuamente acreditou que enfim, iria encontrar um pouco de
diversão e alegria.
Tão logo sentiu o peso do ócio, saiu em busca de afazeres que pudesse
preencher o seu vazio existencial, e
novamente encontrou a barreira de seus parcos recursos. O que lhe
restou? Atividades grátis ou a preços módicos e um novo círculo de amizades com pessoas com
o mesmo perfil: pobres, solitárias e desiludidas. Diante da impossibilidade de realizar os
sonhos acalentados de fazer um cruzeiro, uma viagem internacional, freqüentar restaurantes
elegantes, aceitou o convite das amigas para um baile popular da terceira
idade, na expectativa de encontrar um
cavalheiro para conversar, dançar
e talvez até quem sabe, iniciar um
namorico, porém, já na entrada, percebeu que apenas acrescentaria mais uma desilusão
em sua vida. Em virtude da escassez de
cavalheiros, os organizadores contratam monitores para dançar com as mulheres
e, assim, a noite que prometia muito,
ficou resumida à cinco horas
sentada, em silêncio, porque o som alto
não permitia conversa, e mesmo se o ambiente permitisse diálogo, nada haveria a dizer
porque em suas vidas acumularam apenas frustrações e tardiamente
perceberam a sabedoria das avós que
diziam “que a vida se renova com os filhos, netos e bisnetos!”
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