Era pouco depois das sete da manhã quando a luz entrou — não invadindo, mas pedindo licença pelas frestas da persiana mal abaixada. No minúsculo apartamento do quarto andar, entre uma pilha de livros esquecidos e uma planta que ainda insistia em crescer, algo aconteceu. Um feixe de luz atravessou o copo de vidro deixado na mesa da noite anterior e se partiu em sete. Um arco-íris, tímido e pequeno, se desenhou no chão.
O morador do 7 — nome irrelevante para esta
história — estava sozinho, como sempre. A solidão já era mobília antiga, mais
presente que a geladeira ou o sofá manchado. Mas aquela manhã era diferente. O
homem, em sua rotina exata de silêncio e café preto, parou. Havia um arco-íris
no chão do seu apartamento.
Na física, sabemos: é apenas refração da luz. Mas
no coração, era mais.
As três maiores religiões monoteístas também
acreditam que arco-íris não são só fenômenos ópticos. No judaísmo, o arco-íris
é pacto — o sinal de Deus a Noé de que nunca mais destruiria a Terra com um
dilúvio. Um lembrete de que mesmo após o fim, há promessa de recomeço.
No cristianismo, é ponte entre o divino e o humano.
Um céu que se dobra para tocar o chão, como se Deus quisesse lembrar ao homem
que ainda está por perto, mesmo quando tudo parece em ruínas.
No Islã, embora o arco-íris não tenha a mesma
centralidade, há a reverência às cores como manifestação da criação. O profeta
Muhammad teria falado sobre os sinais de Allah em tudo — e quem vê um arco-íris
sem sentir reverência talvez precise reaprender a olhar.
Entre os povos originários das Américas, o
arco-íris também foi mais que cor. Para os maias, era ligado à deusa Ix Chel,
senhora da lua, da fertilidade e dos ciclos da vida — um presságio de mudança.
Para os incas, ponte para o mundo espiritual. E os astecas viam nele um sinal
de comunicação entre os deuses e a terra. Um código secreto em cores.
Deitado no chão, com os olhos fixos naquele
fragmento de luz colorida, o homem não pensava em tudo isso — mas talvez
sentisse. A beleza sem motivo, a aparição breve, a lembrança de que algo fora
do comum ainda pode acontecer, mesmo num espaço de 28 metros quadrados.
Quando o sol girou e o arco-íris se desfez, ele
permaneceu ali mais um tempo. Sabia que não voltaria amanhã, ou talvez nunca
mais. Mas bastou um. Um arco-íris no chão. Um instante de paz. Um pacto
silencioso com algo maior — fosse Deus, fosse a luz, fosse ele mesmo.
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