quarta-feira, 12 de outubro de 2016

Amigas

Amigas

Mulher que nasce em família numerosa e  passa a infância e adolescência  convivendo somente com parentes, normalmente tem um sonho simples: Ter amigas! Não conhecidas, aquelas que ocasionalmente saem para  baladas, disputam  sem a menor cerimônias os  bonitões disponíveis, pedem dinheiro emprestado e nunca pagam e, sempre lembra de você quando precisa de um favor. Fora  estas circunstâncias,  esquecem o seu  contato.
Falo de amiga verdadeira, aquela que  telefona somente para saber se você está bem,  que aparece de repente em sua  casa para conversar sobre banalidades, dos sonhos futuros e dos passados, que hoje são apenas  lembranças doces; diante  da impossibilidade de se realizarem e, também, é claro, reclamar da tia, do irmão, do padrinho, do marido e segue uma lista infinita. Em família, isto não é possível, vira fofoca  e brigas intermináveis, narizes torcidos, constrangimentos em festas. Amigas falam, falam, falam, aliviam os  corações e a alegria flui  naturalmente. Mulheres que conversam entre si sobre as mazelas da vida, não fazem uso de medicamento de tarja preta porque  estão sempre de alma lavada e o melhor, sem ferir ninguém, já que o que se fala entre amigas verdadeiras desaparece no ar sem deixar o vestígios.
Sempre desejei uma amiga verdadeira que não repetisse as intrigas  dos meus irmos, principalmente do queridinho da mamãe e do protegido do papai. Passei a infância e adolescência tentando, fui traída por todas e, muitas vezes, o desfecho não foi bom e os resquícios  perduram até hoje. Na impossibilidade de falar, com os sentimentos reprimidos desenvolvi doenças psicossomáticas o que levou – me a uma cirurgia das amígdalas. Obviamente que o procedimento cirúrgico não aliviou a angústia crônica e, na primeira oportunidade fiz terapia. É verdade, procurei um profissional para falar das pequenas picuinhas, que acontecem no seio do lar e, dependendo da neurose dos envolvidos,  um simples “abaixe o som”, pode terminar em agressões verbais e até físicas.
Foi ótimo! Minha saúde física e mental melhorou bastante, mudei para longe da minha família e pensei: Agora sim,  vou fazer novas amizades, sem fofocas, a começar pelos vizinhos. Ledo engano! Comecei uma amizade com uma colega de trabalho; tudo parecia  estar dentro da normalidade. Eu freqüentava a casa dela, ela a minha, até que um dia, comprei um tecido  que não serviu ao seu fim e, ela gostou dele e disse que queria comprá-lo, mas não tinha o dinheiro naquele momento, ficou de pagar os R$20,00 assim que recebesse. Tudo certo, porem, até hoje  não recebi e deixei para lá, mas fiquei cautelosa.
Sendo a minha natureza “doação”  sabendo das suas  dificuldades no trabalho, com a carências de seus pupilos, doei-lhe  mais do que o necessário, tanto que ela veio a minha casa várias vezes e saía sempre com duas sacolas carregadas, fora o que eu deixa  na sua caixa de  correspondência. Sempre que eu a convidada para sair ela estava disponível, para jantar em minha casa também, porém, atentei-me para um detalhe, nunca me telefonava ou passava em minha casa para saber como eu estava, ou simplesmente, bater papo, somente se precisava de alguma coisa. Em um destes encontrou, tanto falou em um pudim de leite condensado que ela fez para o pai, tia, madrinha, irmã, sobrinha  que senti um desejo enorme, como os de grávida, de comer o  bendito pudim, feito por ela. Fique sem graça de pedir para fazer um para mim e fui a padaria, comprei e comi até adoçar a minha alma mas a vontade continuava. Comprei em  doceria, supermercados e  nada. Assim, falei com ela e pedi que me fizesse esse agrado  e obtive um sim como resposta. Os dias foram passando e nada.
 Uma nova oportunidade de trabalho surgiu para ela e eu tinha exatamente o material de que ela precisava. Vi  a chance de  saciar a minha vontade da receita de pudim de leite condensado dela. Falei claramente: Chantagem; Troco o livro que você precisa por um pudim da sua receita, feito no fogão a lenha, por você. Novamente, um sim foi a resposta, mas o livro continua  em minha estante.

Diante deste episodio, vejo-me novamente com a mesma reflexão: O quanto vale a minha amizade?  O que uma amiga é capaz de fazer por mim, para que eu possa considerá-la amiga de verdade?  Ainda não tenho  as respostas. Tenho apenas a certeza que continuarei a busca iniciada na infância: Uma amiga sincera!
Outubro 2016

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